segunda-feira, 25 de março de 2013

Happy Birthday Johannah

∞ One Direction ∞ (@MalikInMyBed) tweetou às 4:39 PM on seg, mar 25, 2013: @JohannahDarling HAPPY BIRTHDAY,Hope you have many years of life,health, happiness and that you can realize all your dreams. #BrazilLovesYou (https://twitter.com/MalikInMyBed/status/316227764413947904) Adquira o aplicativo oficial do Twitter em https://twitter.com/download

sexta-feira, 8 de março de 2013

Cáp. 10 - Fic. Biology

Uma dor lancinante dominou minha cabeça por completo quando meu cérebro finalmente se deu conta de que meus olhos estavam abertos. Voltei a fechá-los com força, tentando fazer com que aquela dor passasse ou pelo menos diminuísse, mas parecia que só alguns comprimidos e o tempo a fariam regredir até sumir completamente. Maldita tequila. 
Me sentei na cama, com uma mão do lado esquerdo da cabeça, sentindo meus cabelos levemente úmidos, e abri o olho direito para me localizar. Definitivamente eu nunca estive naquele lugar antes, nunca tinha visto aquelas paredes e móveis brancos, muito menos um quarto tão grande como o qual eu estava agora. Aquele cômodo sozinho equivalia à metade da minha casa, e pelo extenso corredor que a porta aberta revelava, o resto do apartamento era ainda maior.
E foi só então que eu vi a pessoa que havia me cumprimentado quando acordei. Apesar de estar sentada na ponta da cama gigante e bem no meio do meu campo de visão, eu demorei alguns segundos pra vê-la, e mais alguns pra finalmente reconhecê-la. Os mesmos olhos que ontem me passavam segurança, hoje pareciam cansados, sonolentos, e ostentavam leves olheiras arroxeadas de quem tinha passado quase a noite toda em claro.
Abri o outro olho, já mais acostumada à claridade, e o encarei, tentando organizar minha mente. O que eu estava fazendo naquele lugar estranho? Por que ele estava ali?
- Pensei que não fosse acordar mais – Niall murmurou com a voz reservada, piscando lentamente e desviando seu olhar do meu.
- Que lugar é esse? – gaguejei com a testa franzida, sentindo minha voz falhar em algumas sílabas – Você disse que ia me levar pra minha casa.
- E eu ia – ele confirmou, enquanto olhava na direção da janela, e um leve sorriso divertido surgiu em seus lábios – Mas você dormiu antes de me dizer o endereço.
Me lembrei rapidamente de alguns momentos da noite anterior. A festa de Kelly, as doses de tequila, a brutalidade de Paul, a conversa com Niall no carro... Tudo parecia tão vago, tão distante, como se tivesse sido apenas um sonho muito real, que eu me sentia estranha por ter passado por aqueles momentos de verdade.
- Então por que não me acordou? – perguntei, com a testa levemente franzida em um tom defensivo – Por que me deixou dormir? E que lugar é esse afinal?
- Você sempre acorda assim, disparando perguntas? – ele resmungou, fechando pesadamente os olhos e mantendo um esboço de sorriso no rosto. Ele podia estar achando graça, mas eu não.
- Não, porque não costumo acordar num lugar totalmente estranho com uma pessoa estranha me observando! – retruquei, irritada, e ele voltou a me encarar, novamente daquele jeito firme apesar do cansaço aparente.
- Ontem você acabou dormindo no carro, e eu não consegui te acordar de jeito nenhum... E acredite, eu tentei de todas as maneiras que conheço – Niall respondeu, com um pouco de rispidez na voz - Como não sabia seu endereço, resolvi te trazer pra minha casa, mas tô vendo que devia ter te deixado na rua mesmo.
Meus olhos passaram rapidamente pelo quarto, analisando novamente todos os detalhes e ignorando sua brutalidade. Então aquele era o apartamento dele. Olhei pra baixo, e me vi enroscada num lençol, com roupas diferentes das que eu vestia ontem. Quando finalmente a ficha caiu, soltei um grito horrorizado e me enrolei nas cobertas, me cobrindo até o pescoço.
Eu estava de roupas íntimas. Na casa do professor Horan.
- O QUE É ISSO? – berrei, em pânico, e vi que Niall estava com os olhos arregalados e um pouco encolhido de susto – POR QUE EU NÃO ESTOU VESTIDA?
- Tá, agora você tem motivos pra disparar perguntas – ele respondeu, se endireitando novamente, meio sem jeito – Essa parte da história foi culpa minha.
- COMO É QUE É? – gritei, me abraçando firmemente – VOCÊ TIROU MINHA ROUPA ENQUANTO EU TAVA DORMINDO?
- Eu disse que tentei de várias maneiras te acordar ontem, e uma das minhas tentativas foi te colocar debaixo do chuveiro gelado... O que não funcionou, pelo que você pode perceber – ele explicou, um tanto encabulado – E pra isso, eu achei... Conveniente tirar seu vestido.
- CONVENIENTE? COMO VOCÊ TIRA MEU VESTIDO SEM O MEU CONSENTIMENTO E TEM A CORAGEM DE DIZER QUE ACHOU CONVENIENTE? – exclamei, sentindo a dor de cabeça quase explodir meus miolos, mas com raiva demais pra me acalmar.
- Dá pra você falar baixo, por favor? – Niall pediu, com a voz elevada e os olhos fechados, acompanhados pela testa franzida de irritação – Se você tentasse ignorar sua opinião sobre mim e não tirasse conclusões precipitadas sobre o que aconteceu antes de me ouvir, as coisas seriam bem mais simples.
Fiquei em silêncio, mas não porque ele pediu, mas pelo choque de estar nas minhas condições físicas atuais. Ainda me abraçando, com os músculos tensos, eu esperei até que ele voltasse a falar, encarando-o com raiva.
- Não vou dizer que não foi difícil pra mim resistir, porque foi. Eu sou homem, não consigo evitar esse tipo de pensamento. Mas eu não fiz nada, acredite você ou não. Acha que eu queria que você dormisse aqui? Acha que eu planejei isso, que eu fiz de propósito pra poder dormir com você? Eu não sou santo, mas não me aproveito de mulheres inconscientes pra conseguir o que quero. Não preciso disso.
- Você não espera que eu acredite nessa sua versão fajuta dos fatos, espera? Porque sinceramente, eu não engoli uma palavra do que você disse – rosnei, com vontade de sair correndo dali, mas pra isso, eu precisava do meu vestido – Eu jamais devia ter aceitado entrar num carro com você, onde eu estava com a cabeça?
Niall desviou seu olhar do meu, olhando novamente pela janela com a expressão derrotada. Ontem ele quase conseguiu me amolecer com sua atitude politicamente correta, mas se agora ele queria o mesmo efeito, teria que ir muito mais além daquela carinha de cachorro sem dono.
- Nada do que eu diga ou faça vai te fazer mudar de idéia, não é? – ele murmurou, com os olhos cerrados pela claridade e a testa pesadamente franzida sobre eles – Eu devia ter feito tudo errado, só pra poder me sentir devidamente culpado pelas suas acusações.
Sua voz estava carregada de frustração, demonstrando que ele estava num dos seus raros momentos de sinceridade. Seus lábios estavam contraídos, seu maxilar estava tenso, seus olhos estavam fixos em algum ponto lá fora, mas ainda assim eu podia enxergar ressentimento neles. E se ele realmente estivesse dizendo a verdade? Se ele tinha sido capaz de fazer boas ações por mim, porque não acreditar em sua versão, já que eu não estava consciente pra comprovar a minha?
- Onde está meu vestido? – falei baixo algum tempo depois, sem conseguir esconder meus pensamentos conflituosos na voz e na expressão confusas. Niall se levantou, sem olhar pra mim, e novamente eu senti falta de seu contato visual. Ele era uma pessoa muito misteriosa pra mim, e sempre que ele me olhava, era como se eu pudesse lê-lo, decifrá-lo, entender o que ele estava pensando. Quando ele não me olhava, eu ficava no escuro, sem saber onde estava pisando. Ele caminhou pra fora do quarto e sumiu de vista por alguns segundos, até surgir novamente com meu vestido nas mãos. Sem nem se aproximar muito e ainda evitando meu olhar, ele o deixou sobre a beira da cama e saiu, fechando a porta atrás de si pra que eu me trocasse. Como se ele já não tivesse me visto de calcinha e sutiã.
Continuei sentada por alguns minutos, encarando os lençóis bagunçados ao meu redor. Meus sentimentos estavam remexidos, misturados, fundidos numa grande bola de neve. Ainda meio em transe, fiquei de pé e peguei meu vestido, colocando-o facilmente. Assim que o tecido deslizou pelo meu rosto, pude sentir o perfume masculino dele impregnado na roupa. Provavelmente ele tinha ido parar ali quando Niall me carregou até o apartamento ontem.
Por um segundo, imaginei como teria sido pra ele ter me visto daquele jeito. Vulnerável, indefesa, desmaiada, totalmente sob o comando dele. Me lembrei do que ele tinha dito sobre resistir àquela situação, e estremeci de medo. Estranhamente, não de medo dele, e sim pelo fato de não estar consciente e não ter noção do que se passava ao meu redor. Eu odiava essa sensação. E por pior que aquilo pudesse parecer, eu tive a intuição de que ele não tinha me feito nada de mal. Se tivesse, estaria jogando na minha cara que conseguiu o que tanto queria, e não o contrário. Me sentei novamente na beirada da cama e calcei meus tênis que estavam ao lado da cama, ainda pensativa. Peguei minha bolsa, que estava sobre o criado-mudo, e após verificar rapidamente se tudo estava em seu devido lugar dentro dela, deixei o quarto, procurando por Niall, encontrando-o no cômodo ao lado.
Parei à porta aberta, me deparando com uma única parede azul em meio às outras três brancas, uma cama tão grande quanto a que eu tinha dormido, já arrumada, e um par de ombros nus e muito bem definidos. Sem querer, meu olhar se demorou nessa última parte em especial. Niall, que estava virado de costas pra mim enquanto desvirava sua blusa do avesso, virou apenas a cabeça na minha direção, e encarou meus olhos confusos com uma certa indiferença.
- Se sente melhor agora que está vestida? – ele perguntou secamente, voltando sua atenção pra blusa em suas mãos e vestindo-a num segundo. Por um momento eu quis responder que preferia estar de roupas íntimas, desde que ele também estivesse.
- Sim, muito – respondi enfatizando a última palavra, abafando a onda de calor que subitamente percorreu meu corpo e tentando ignorar o fato de que meu vestido cheirava maravilhosamente bem devido ao seu perfume e fazia questão de me lembrar disso cada vez que eu respirava.
- Ótimo – Niall acrescentou com a mesma indiferença de antes, ficando de frente pra mim – Então vamos.
Franzi a testa quando ele caminhou na minha direção, bagunçando de leve os cabelos com as pontas dos dedos e novamente evitando meu olhar, e eu preferi não continuar olhando-o e acabar demonstrando minha súbita hipnose na expressão.
- Vamos? Pra onde? – questionei, enquanto ele passava por mim, aproximando perigosamente seu abdômen sarado de meu corpo.
- Eu vou te levar até a sua casa – ele respondeu, ainda daquele jeito duro, como se o que ele dizia fosse totalmente óbvio - Pelo que sua mãe me explicou, você mora um pouco longe daqui, então eu pensei que uma carona de carro seria útil.
Arregalei meus olhos, sentindo minha garganta secar. Ele tinha falado com a minha mãe? Como? Quando? Onde?
- Antes que você comece com as suas perguntas, sim, eu falei com ela – ele leu minha mente, parecendo impaciente ao ver o choque em minha expressão – Não ia deixá-la preocupada com o seu paradeiro, ela não parava de ligar pro seu celular e eu resolvi atender. Mas fique tranqüila, eu expliquei tudo o que aconteceu e ela acreditou na minha versão da história. Ficou bem mais calma sabendo que você está em boas mãos.
Continuei encarando-o, sem saber o que pensar. Que versão da história seria aquela que faria minha mãe se acalmar diante de meu sumiço? Se antes eu estava confusa, agora meus neurônios pareciam ter dado vários nós cegos entre si. Niall Horan falando com a minha mãe... Dói só de tentar imaginar uma cena tão estranha. E desde quando as mãos dele eram boas mãos? Minha mãe realmente não tinha noção dos horrores que dizia.
- Eu devo estar dentro de um sonho muito esquisito – falei, rindo da minha própria bagunça mental – Não é possível que da noite pro dia tudo isso tenha acontecido, que todas essas loucuras tenham se tornado realidade.
- Desculpe te informar, mas essa é a mais pura verdade – Niall disse, entediado – Podemos ir agora? Eu ainda tenho muita coisa pra fazer hoje.
Suspirei, derrotada e com uma pontinha de irritação, e apenas assenti. Já que a casa dele era realmente longe da minha, uma carona seria o mínimo que ele podia fazer por mim depois de todos os misteriosos acontecimentos da noite anterior. Ele caminhou em direção à porta, e eu apenas o segui, sem dizer uma palavra sequer e observando discretamente a imensidão daquele apartamento. Descemos pelo elevador, e vinte e três andares depois, estávamos na garagem. Todos os carros estacionados ali eram incrivelmente lindos e caros, o que me fez pensar de que mundo ele vinha. O carro mais barato ali era provavelmente a BMW preta de Niall, que não estava sozinha nas três vagas reservadas para seu apartamento. Uma Ferrari vermelha e sua familiar moto amarela de todo dia ocupavam os outros dois espaços, o que só me fez ficar ainda mais perdida.
- Esses carros... São seus? – perguntei, apontando pra BMW e depois pra Ferrari, com uma cara impagável de perplexidade.
- São – Niall respondeu, com uma normalidade deprimente – Pensei que já conhecesse a Ferrari.
Virei minha cabeça devagar em sua direção até meus olhos incrédulos encontrarem os dele, fingindo que eu não existia. É agora que eu descubro as câmeras ou isso realmente não era uma pegadinha?
Niall tirou uma chave de carro do bolso, caminhando até um dos veículos. Apertou o botão do alarme e se dirigiu à BMW, abrindo a porta do motorista e voltando a me olhar ao perceber que eu ainda estava imóvel. Ainda sem acreditar naquilo, caminhei lentamente até a porta do carona, e entrei no carro em silêncio. Olhei pelo vidro para a Ferrari estacionada ao meu lado e reconheci seu interior, me amaldiçoando mentalmente por estar tão transtornada na noite anterior a ponto de entrar num carro daqueles e não me lembrar disso.
Niall deu ré e seguiu em direção à saída do estacionamento subterrâneo, logo fazendo com que o forte sol invadisse as janelas sem piedade de meus globos oculares. Cerrei meus olhos, incomodada, e ele estendeu uma mão até o porta-luvas, tirando lindos e visivelmente caríssimos óculos escuros de lá. Me senti tão insignificante quanto o estofado do assento quando ele colocou os óculos, que se ajustavam perfeitamente ao formato de seu rosto.
- Onde mais você trabalha pra conseguir essas coisas todas? – perguntei, finalmente falando após o que me pareceu uma eternidade de mudez, com a expressão desconfiada. Foi bom saber que eu ainda não tinha me esquecido de como falar, eram tantos acontecimentos inacreditáveis que eu provavelmente estava entrando em estado de choque. Niall não pareceu me ouvir, abrindo os vidros e deixando que o vento bagunçasse nossos cabelos.
- Sabia que gigolôs ganham muito bem por aqui? – ele respondeu, sem expressão enquanto olhava pra frente, e eu gelei. Provavelmente vendo minha cara horrorizada, já que eu não podia confirmar isso por causa de seus óculos, eu vi um teimoso sorrisinho de canto surgir em seu rosto.
- O patrimônio de minha família me permite “conseguir essas coisas todas” – ele disse, sendo sincero agora, e eu senti meus ombros relaxarem imediatamente com a resposta aceitável – Sua cara de choque valeu meu dia.
-Idiota – murmurei, revirando discretamente os olhos e virando meu rosto pra janela ao meu lado.
-Se você quase acreditou que eu era um gigolô, é porque eu sou muito pior que um idiota pra você – ele falou, com um senso de humor mórbido na voz enquanto parava num sinal vermelho.
- Você nem imagina o quanto – rosnei, ficando mais irritada a cada segundo. Não saber definir as pessoas era algo que me deixava profundamente incomodada, e Niall era exatamente o tipo de pessoa indefinível o suficiente pra me enfurecer. Ele tinha várias faces, uma completamente diferente da outra, como se fossem várias personalidades dentro de uma pessoa só. Eu conhecia bem seu jeito sujo e desonesto, mas por vezes ele se mostrava alguém completamente oposto... Alguém bom. Preferia me manter distante daquela encrenca, obrigada.
- Eu até imagino – ele retrucou, hostil – Mas prefiro ouvir da sua boca.
Olhei pra ele com a testa franzida de deboche, e vi que ele também me encarava, novamente com os lábios contraídos de raiva. Agora eu conseguia ver seus olhos pelo ângulo em que a luz do sol batia nas lentes dos óculos, e vi que eles me fitavam desafiadoramente.
- Eu acho que você é um filho da puta de um pedófilo, safado, mal amado, nojento, desprezível, broxa, ridículo, estúpido, grosso, pilantra e arrogante – eu disparei, sustentando seu olhar com avidez. Definitivamente eu tinha feito uma descoberta: falar mal das pessoas na cara delas era extremamente terapêutico.
Niall continuou me encarando, parecendo não acreditar na quantidade de xingamentos que eu tinha usado para defini-lo, e eu percebi que o sinal estava verde, já que os carros à nossa frente começavam a andar. Ele pareceu não se dar conta disso, estava inconformado demais com a minha resposta pra prestar atenção em outra coisa. O silêncio tenso entre nós, junto com a expressão dele, de quem estava prestes a triturar meus ossos, só aumentou a impressão de que se direitos humanos não existissem e não dessem cadeia, eu estaria fodida.
Só quando os carros atrás de nós começaram a buzinar, Niall suspirou lenta e profundamente, contendo-se, e voltou a olhar pra frente, desfazendo nosso contato visual intenso com dificuldade. Arrancou velozmente, fazendo os carros que buzinavam atrás de nós comerem poeira, e passou a segurar o volante com força, controlando-se pra não me quebrar em pedacinhos. Ele podia estar querendo muito, mas não era doido de tentar encostar um dedo em mim.
Chegamos sem demora à minha casa graças à direção acelerada dele, sem dizer mais nenhuma palavra pelo caminho. Assim que ele estacionou na frente de minha casa, abri a porta, sem ousar olhá-lo, e quando estava prestes a sair do carro, ouvi sua voz dizer, extremamente trêmula de ódio:
- Não precisa se preocupar, nunca mais vou olhar na sua cara.
Virei meu rosto na direção dele, e vi que ele encarava algum ponto à sua frente, com os maxilares tensos e as veias do pescoço levemente saltadas. Suas mãos agarravam o volante, perigosamente fortes, o que só tornava sua ira ainda mais visível. Parecia que eu realmente tinha conseguido o que tanto queria, me livrar dele de uma vez por todas.
- Ótimo – murmurei, esperando a alegria imensa me dominar por aquele momento tão perfeito, que curiosamente parecia não querer chegar. Engoli em seco, sentindo meu olhar se tornar inseguro enquanto viajava por suas feições fechadas, e num movimento brusco, saí do carro, batendo a porta com uma certa força. Nem bem eu o fiz e Niall já estava longe, acelerando assustadoramente depressa e fazendo meus cabelos voarem na direção do vento.
Observei a BMW se afastar rapidamente, sentindo uma coisa esquisita dentro de mim. Suspirei profundamente, agora com o olhar vago em meus pés, tentando reprimir aquela coisa ruim que insistia em se alastrar pelo meu corpo, me desanimando por completo.
Eu não podia estar triste, ele finalmente estava fora do meu caminho! Aquilo era tudo o que eu sempre quis desde a primeira vez em que o vi, e agora que tinha finalmente acontecido, eu não podia admitir que meu único sentimento fosse de remorso. Tudo que eu conseguia sentir era peso na consciência, decepção comigo mesma por ter sido injusta com uma pessoa que talvez não merecesse tanta crueldade. Afinal de contas, se não fosse por ele, os estragos de Paul teriam sido imensuravelmente piores.
Fechei os olhos com força por um momento, desanuviando minha mente e me esforçando para parecer despreocupada. Me virei na direção de minha casa, tentando fingir que estava tudo bem, e a cada passo eu ficava mais convicta de uma coisa.
Não estava tudo bem.

Acordei no dia seguinte com a sensação de que tinha acabado de pegar no sono. Após um longo dia de explicações e adaptações dos verdadeiros acontecimentos pra minha mãe, que estava aflita me esperando chegar, eu passei a noite inteira rolando na cama, inquieta. Nada parecia fazer sentido, nada parecia ser coerente, tudo estava desconexo, bagunçado, confuso. Por mais que eu tentasse compreender a insistente culpa dentro de mim, não conseguia encontrar uma explicação que prestasse.
Me levantei antes mesmo que o relógio despertasse, anunciando que eram 6 da manhã de segunda-feira, e fui tomar banho, com a falsa crença de que uma ducha quente fosse melhorar meu humor. Uns trinta minutos depois, eu já estava me vestindo desanimadamente, e logo depois penteando meus cabelos, de frente pro espelho. Assim que terminei, encarei meus próprios olhos, cansados pela noite em claro, e decidi que ia terminar com aquela angústia. Eu precisava pedir desculpas a ele, precisava pelo menos tentar. Só assim eu conseguiria afastar aquele mal estar de mim.
Tomei meu café-da-manhã em silêncio, só respondendo uma coisa ou outra quando mamãe perguntava, e logo estávamos estacionando na frente da escola. Um arrepio percorreu minha espinha enquanto caminhava pela entrada do colégio, e meus olhos logo encontraram uma Eleanor tensa me encarando de volta.
- Oi, (seu apelido) – ela murmurou, com um sorriso triste, e me abraçou carinhosamente. Ela sabia sobre a festa no sábado, eu tinha lhe contado tudo por telefone no dia anterior. Bem, quase tudo, só preferi deixar de lado a parte que envolvia meu comportamento estranhamente triste por causa do Horan.
- Parece que eu não te vejo há anos – suspirei, abraçando-a com mais força.
- É mesmo – ela concordou, se afastando alguns segundos depois pra poder me olhar – Você tá tão abatida... Tem certeza de que está bem?
- Tenho – menti, empurrando a verdade garganta abaixo – Só tô um pouco cansada.
Nos sentamos em nosso lugar de sempre, esperando até que o sinal tocasse, e senti Eleanor me cutucar discretamente enquanto conversávamos. Me virei na direção que ela me indicou, e só quando meu olhar encontrou o dele, me lembrei de que Hazza existia. Me senti estranha quando ele sorriu pra mim, especialmente radiante como em toda segunda-feira, e tudo que consegui fazer foi esboçar um sorriso fraco de volta. Senti como se não merecesse aquele sorriso dele.
- Bom dia, Calder - ele cumprimentou quando passou por nós, como sempre fazia, e logo depois se dirigindo a mim e abaixando seu tom de voz – Bom dia, pequena.
- Bom dia – gaguejei, mal conseguindo sustentar seu olhar alegre. Parecendo alheio a qualquer sinal de tristeza meu, Hazza seguiu até a sala dos professores, e assim que o vi fechar a porta atrás de si e sumir, soltei o ar que estava preso em meus pulmões, finalmente relaxando.
- Você vai contar a ele? – ouvi a voz cuidadosa de Eleanor perguntar, e apenas fiz que não com a cabeça, sem olhá-la. Contar a Hazza o que quer que fosse não estava nos meus planos, ele não merecia saber das ameaças de Kelly, muito menos de nada que se passava na minha mente. Não queria ser injustamente cruel com mais alguém.
As três primeiras aulas se arrastaram morbidamente. Eu mal conseguia prestar atenção na matéria, minhas mãos estavam trêmulas pra copiar, um aperto na boca do estômago me impedia de desviar meus pensamentos daquela tortura repentina. Por mais que eu respirasse fundo e fechasse os olhos por alguns segundos, meu mal estar só se ausentava momentaneamente, voltando ainda pior logo em seguida.
No intervalo, desci as escadas em silêncio com Eleanor, querendo logo que aquele dia acabasse. Ela parecia entender minha introversão e se manteve quieta, me deixando pensar sem interrupções. Como se houvesse algum jeito de interromper minha aflição infundada. Sentamos no mesmo canto de sempre, e enquanto ela terminava uns exercícios de matemática, eu observava vagamente o fluxo de pessoas pelo pátio, até meus olhos novamente encontrarem Hazza.
Ele andava apressado em direção à saída da escola, falando energicamente ao celular com a expressão pesadamente preocupada. Senti uma fisgada no peito, como se fosse um súbito mau pressentimento, e ele logo sumiu de vista, me deixando ainda mais agoniada. Pensei em comentar com Eleanor, mas eu realmente não estava a fim de falar hoje e preferi esperar até saber do que se tratava. Obviamente, eu pretendia me inteirar da situação hoje mesmo, se ele voltasse ao colégio.
Vinte minutos depois, o sinal tocou, indicando o término do intervalo, e nós nos levantamos devagar. Logo estávamos subindo as escadas lenta e silenciosamente, e me surpreendi quando ouvi alguém sussurrar no meu ouvido, vindo por trás de mim.
- Vem comigo.
Não precisei olhar pra trás pra reconhecer a voz de Hazza, e lancei um último sorriso fraco pra Eleanor antes de acompanhá-lo até uma sala vazia no segundo andar. Ninguém parecia se dar conta de nossa existência, ocupados demais com suas próprias vidas, por isso não hesitei em entrar naquela sala sozinha com ele.
- Que saudade de você – ele murmurou, sorrindo de um jeito calmo e me dando um beijo delicado, que fez meu sangue formigar daquele jeito de sempre nas veias. Estar perto dele me trouxe uma sensação temporária de alívio, e me permitiu sorrir sinceramente, mesmo que um sorriso tímido.
- Também senti sua falta – menti, me sentindo novamente desmerecedora daquele carinho por não ter pensado nele uma única vez desde que acordei no dia anterior. Passei meus braços ao redor de seu pescoço, e Hazza apenas me abraçou apertado, sem me beijar novamente. Agradeci mentalmente a gentileza dele por não me forçar a encarar seus olhos e ver minhas mentiras refletidas neles, e respirei profundamente seu perfume, que hoje cheirava levemente a...
- Formol? – indaguei, franzindo a testa e me afastando de leve pra poder ver seu rosto.
Hazza riu baixinho, fechando os olhos por um momento.
- Desculpe, eu não imaginei que o cheiro estivesse tão forte a ponto de você notar – ele disse, ainda sorrindo, mas me olhando calmamente – Talvez seja por isso que eu não goste de dar aulas nos laboratórios.
- Como assim? – perguntei, sentindo meu coração acelerar um pouquinho – Você deu aulas práticas hoje?
- É, o Horan não pôde vir pra escola e eu o substituí – ele suspirou, entortando a boca – Aquele doido enfiou a BMW num poste ontem de manhã.
Mesmo sem poder me ver, soube que empalideci. Senti todo o meu sangue simplesmente evaporar e meu coração congelar simultaneamente. Minha expressão estava totalmente chocada, perplexa, apavorada. O mau pressentimento estava explicado.
- Ah... É? – gaguejei, tentando não parecer tão horrorizada quanto eu realmente estava – E c-como ele tá?
Hazza pareceu não notar minha agonia e continuou sorrindo de um jeito divertido ao responder:
- Melhor do que nós, pode apostar. Ele não se machucou muito, apenas bateu a cabeça com força no volante enquanto tentava frear e ficou desacordado por alguns minutos. Acabei de voltar do hospital onde ele está em observação, falei com o médico e com o próprio Horan, e ele me disse que amanhã mesmo poderá voltar a dar aulas.
A imagem de Niall batendo com o carro surgiu em minha mente sem esforço, seguida pela cena de vários paramédicos imobilizando-o na maca enquanto ainda estava desacordado. Um desespero enorme subiu pela minha garganta, fazendo lágrimas se formarem em meus olhos, mas eu fiz o máximo de força pra contê-las, pelo menos enquanto estava na frente de Hazza.
- Eu... Tenho que ir... Me lembrei de que tenho uma prova agora – foi tudo que consegui gaguejar, me afastando dele devagar e evitando seus olhos – Depois a gente se vê.
Abri a porta da sala de aula, deixando Hazza totalmente confuso, e subi correndo as escadas, já mais vazias, até o meu andar. Mal conseguindo conter as lágrimas e com as pernas perigosamente trêmulas, me enfiei num dos cubículos do banheiro feminino, e só depois de trancada e sentada no vaso sanitário fechado, finalmente caí num choro inexplicável.
Tudo que eu conseguia sentir era culpa. Nojo de mim mesma, repulsa, remorso, um peso imenso me impedia de respirar, me afundando cada vez mais num choro que parecia não ter fim. Sufocando meus soluços com as mãos cobrindo a boca, eu sentia meu rosto lavado de lágrimas esquentar à medida que o ar me faltava, mas não encontrava força pra respirar.
Quando pensei que fosse desmaiar por falta de oxigênio, meus pulmões entraram no modo de emergência, puxando o ar pra dentro de si em inúmeras inspirações rápidas. Meus olhos não paravam de liberar lágrimas, e meu nariz começava a ficar congestionado, mas eu não me importava. As imagens daquele sábado vieram imediatamente à tona: minhas palavras rudes, o olhar furioso de Niall, seus dedos apertando o volante com força, trêmulos de ódio, sua arrancada bruta quando foi embora... Tudo estava muito claro. Todos os pensamentos que ocupavam minha mente se resumiam a uma única frase, que meu cérebro insistia em repetir sem parar.
Se Niall estava numa cama de hospital nesse exato momento, por melhor que fosse seu estado, era culpa minha.
FIM DA MARATONA DE 04 CAPÍTULOS DA BIOLOGY, CONTINUA......

Cáp. 09 - Fic. Biology

- É aqui, mãe. 
Encarei dolorosamente a enorme e iluminada casa de Kelly assim que mamãe parou o carro rente ao meio-fio. Eu estava com um vestido azul escuro xadrez que ia até os joelhos, meus All Star azuis acinzentados de tão gastos e uma discreta bolsa preta, vestida até demais pra uma festa na mansão dos Smithers. Casais sem roupa aprontando pelos jardins era rotina em suas festinhas particulares, disso todo mundo sabia.
- Qualquer coisa me liga que eu venho te buscar - ouvi mamãe dizer, ainda desacostumada à idéia de me ver numa festa como aquelas. Ela sabia exatamente que eu não gostava desse tipo de evento, mas concordou em me levar quando eu fingi estar socialmente interessada naquela festa.
Assenti devagar, tirando o cinto e saindo do carro. Caminhei determinadamente na direção da porta da casa, ouvindo os batimentos acelerados de meu coração apesar da música alta que se tornava cada vez mais ensurdecedora a cada passo. Eu sentia medo pulsando em minhas veias, um medo indescritível de toda aquela situação.
Toquei a campainha quando meus pés afundaram no tapete de boas vindas da casa, e logo Kelly abriu a porta, revelando uma roupa totalmente promíscua. Assim que me viu, o mesmo sorrisinho maligno do dia anterior surgiu em seu rosto, e umas duas ou três garotas correram pra direções diferentes, provavelmente pra espalhar o boato de que (S/N) (seu sobrenome) estava numa festa de Kelly Smithers. Torci pra que elas não saíssem contando o motivo da minha presença também.
- Você veio mesmo - Kelly sorriu, erguendo as sobrancelhas em tom de surpresa - Pensei que não teria coragem.
- Vamos logo com isso - murmurei, tentando não demonstrar a insegurança que urrava dentro de mim.
Ela me deu passagem e eu entrei, sentindo instantaneamente o cheiro de cigarro, suor e álcool que dominava o ambiente. Muitas pessoas dançavam pelos cômodos, virando copos de bebida e passando as mãos onde bem entendessem nos corpos alheios. Com toda aquela gritaria bagunçando minha mente, eu podia jurar ter visto um olhar intrigado conhecido no meio de várias garotas quando meus olhos rapidamente percorreram o sofá da sala. Continuei seguindo Kelly até as escadas da casa, onde já se podia caminhar normalmente, e rapidamente subimos para o andar de cima. Ela abriu a porta de um dos quartos, interrompendo os amassos de um casal, e não precisamos dizer nada pra que eles se tocassem e saíssem.
- Como você percebeu, eu tenho uma festa animada pra aproveitar lá embaixo - Kelly sorriu, virando-se pra mim depois de fechar a porta do quarto atrás de nós - Então não vou demorar muito com você.
- Eu não pretendia passar muito tempo aqui mesmo - falei, sem emoção na voz, e ela ergueu uma sobrancelha, de um jeito que não me agradou muito.
- Ah, mas você vai - ela disse, cruzando os braços e sorrindo zombeteiramente da minha cara - Se realmente quiser manter seu caso com o sr. Styles escondido, você ainda vai freqüentar várias das minhas festinhas.
- Como é que é? - perguntei, rindo nervosamente com o olhar irritado fixo nela - O que exatamente você quer de mim, garota?
- Não vou pedir muito, vou até ser bem boazinha com você, só porque estudamos juntas desde que me conheço por gente - Kelly respondeu, como se estivesse fazendo um ato de caridade - Se você não quiser ver suas fotos no carro do sr. Styles estampadas na primeira página do jornal da escola, terá que obedecer a duas condições.
Ela fez uma pausa, só pra aproveitar mais um pouquinho a minha cara de enterro, e continuou:
- Primeiro, você vai ter que concordar em me fazer alguns favores de vez em quando, por exemplo, a minha lição de casa... E a das minhas amigas também, claro. Eu sei que isso é bem pouco perto da seriedade do seu segredinho, mas eu disse que ia ser boazinha.
- E a outra condição? - rosnei, tentando ignorar o fato de que teria de copiar no mínimo umas sete vezes as respostas gigantes dos exercícios do Hammings até achar um jeito de me livrar daquela chantagem barata. Kelly soltou um risinho satisfeito, apesar de seu olhar fulminante, e respondeu:
- Não ouse dirigir uma palavra ao Horan.
Franzi a testa em tom de desprezo, e não pude evitar uma risadinha baixa.
- Peraí, deixa eu ver se entendi - falei, segurando uma gargalhada - Você quer que eu faça a sua lição de casa e ignore o Horan em troca do seu silêncio?
Mais engraçada do que aquela situação toda foi a cara de tacho da Smithers, totalmente sem resposta diante do meu divertimento. Nem pra chantagear alguém ela prestava. Ignorar o Horan é algo que eu adoro fazer, só ela ainda não tinha se tocado disso. Provavelmente ela sabia da cisma dele comigo, e estava se aproveitando daquela situação pra me manter longe dele e garantir sua atenção só pra ela, coitadinha.
- Se quiser que eu piore, é só falar - ela resmungou, totalmente desmoralizada, e eu engoli o riso. O assunto era sério, apesar do fracasso de Kelly como chantagista.
- Não, eu aceito essas condições - assenti, colocando as mãos nos bolsos do vestido - Bom, se for só isso, eu já vou indo.
- Mas já? Pra que a pressa? - Kelly perguntou, franzindo a testa do seu jeito cínico sem tirar um sorrisinho de canto do rosto - Bebe alguma coisa, senta um pouquinho. As meninas têm várias perguntas pra te fazer.
- Perguntas? - repeti, sem entender - Sobre o que?
- Oras, conquistar o professor mais desejado e intocado da escola não é motivo de curiosidade? - ela sorriu, encostando-se na porta e me impedindo de sair. Que absurdo, meu Deus do céu. Aquilo só podia ser uma piada. Como ela e as amiguinhas conseguiam ser tão putas?
- Você já conseguiu o que queria, agora me deixa ir embora - rosnei, quase dando um soco na fuça dela.
- Acho que esqueci de te avisar que os favores que vai fazer pra mim começam hoje - ela disse, como se eu tivesse problemas mentais e só entendesse as palavras se fossem ditas numa velocidade mais lenta que a normal - E o primeiro deles é ficar até o fim da festa. Quero ver como você se sai num ambiente completamente diferente do qual você tá acostumada a ficar. Talvez não seja tão divertido pra você, mas aposto que vou adorar a experiência.
Pude ver minha cara de perplexidade refletida nos olhos brilhantes de malícia de Kelly, e soltei um suspiro derrotado ao pensar no que estava em jogo ali. Minha relação com Hazza, minha felicidade estava em risco, era um segredo perigoso demais pra arriscar uma rebeldia contra as condições dela.
- Que seja - murmurei, evitando encará-la e ver a alegria maldosa em seu rosto. Kelly abriu a porta com um sorriso, finalmente me deixando sair, e eu a acompanhei até o andar de baixo, sem acreditar na cilada na qual eu tinha acabado de cair.
- A casa é sua, querida - Kelly disse, cínica, quando descemos o último degrau da grande escadaria de mármore - Fique à vontade... Se conseguir.
Soltei um suspiro fúnebre enquanto me encaminhava pra qualquer lugar daquela mansão, fazendo questão de seguir a direção oposta à de Kelly. Por onde eu passava, via pessoas conhecidas da escola, e as poucas ainda sóbrias demonstravam curiosidade por me ver naquele lugar. Encontrei um balcão onde um rapaz preparava alguns drinques, e resolvi ficar por lá, já que a meia dúzia de pessoas sentadas ali pareciam estar bêbadas demais pra sequer se mexer.
- Cerveja, por favor - rosnei ao barman, com a garganta coçando por álcool. Se era pra encarar aquele martírio, que algo me ajudasse a passar o tempo mais rápido. Não sei te dizer em quantas línguas diferentes eu xingava Kelly em pensamento por me manter presa naquela festa horrorosa. Ela sabia muito bem que eu não suportava ficar em lugares como aquele, e ainda me forçava a aturar aquele bando de gente que eu já odiava quando estavam lúcidos, e conseguia odiar mais ainda quando estavam bêbados.
O barman logo me entregou uma latinha de cerveja, cuja metade do conteúdo eu mandei garganta abaixo de uma vez só, sem hesitar. Sentindo o líquido gelado descer dentro de mim, voltei a observar a bagunça na qual aquela casa tinha se transformado. Nada parecia estar em seu lugar, ninguém parecia estar em seu juízo perfeito... A não ser aqueles olhos.
Franzi a testa de leve, me perguntando se aquilo já era efeito da cerveja, mas era impossível com apenas um gole. Eu ainda podia senti-la descendo pela minha garganta, eu ainda me sentia lúcida o suficiente pra saber bem o que estava vendo. Aquilo era real, ele realmente estava ali, a poucos metros, me encarando como se soubesse que eu estava precisando de ajuda, como se soubesse que eu não estava ali por vontade própria. Seu olhar estava fincado no meu, extremamente sério, intrigado, preocupado. Havia muito mais coisas naqueles olhos do que eu podia descrever, me prendendo, me imobilizando, me retraindo.
Eu já devia imaginar que Niall Horan estaria naquela festa.
Não sei por que fiquei tão surpresa, afinal, ele era praticamente fixo da Smithers, todas as garotas de seu bandinho sabiam que ele era quase uma propriedade dela. Mas parecia que naquela noite ele estava liberado de sua monogamia, porque três garotas o rodeavam, uma mais descoberta que a outra. Niall estava sentado num sofá perto de onde eu estava, com os braços abertos e apoiados no encosto do móvel, e tinha uma garota de cada lado seu, acariciando seu peito e sussurrando em seu ouvido com sorrisos pervertidos. Fora a terceira, que tinha uma perna de cada lado de seu quadril e estava sentada em seu colo, beijando-lhe indecentemente o pescoço. Mas apesar de tudo aquilo, era em mim que seu olhar repousava, como se tentasse descobrir o motivo de minha presença.
Desviei meu olhar do dele, sentindo meu coração disparar. Não estava sendo nada agradável estar sendo observada daquele jeito tão invasivo por uma pessoa como ele, o que só aumentava minha vontade de cometer suicídio por estar ali. Dei mais um grande gole na minha cerveja, encarando qualquer ponto ao meu redor que estivesse distante dele, mas meus olhos se recusaram a me obedecer quando o professor Horan se livrou das três garotas que o provocavam e caminhou rapidamente na direção de Kelly, que passava por perto. Ele a segurou bruscamente pelo braço, de cara fechada, e disse algo em seu ouvido, pra que a música ensurdecedora não a impedisse de ouvi-lo. Afirmei pra mim mesma que aquela conversa tensa que se desenrolava entre os dois não podia ter a mínima relação comigo, mas ainda assim era impossível não observá-los.
Pela repentina mudança de humor de Kelly, a conversa não estava sendo das melhores. Niall falava entusiasticamente em seu ouvido, gesticulando de leve com uma lata de cerveja nas mãos e com a testa constantemente franzida, e Kelly o respondia com incredulidade, com as mãos na cintura. Após um tempo de conversa, ela, que estava de costas pra mim, virou o rosto na minha direção e me lançou um olhar fuzilante. Niall simplesmente disse mais algumas palavras, mantendo a expressão séria, e se afastou rapidamente, encolhendo seus ombros largos para poder passar pela multidão desvairada. Desviei meu olhar do dela, engolindo depressa o resto da minha cerveja, já sem tanta certeza de que aquilo não era sobre mim.
Os minutos foram se arrastando torturantemente, as cervejas foram descendo uma a uma, e uns quarenta minutos depois, eu já tinha perdido a conta de quantas latinhas tinha tomado. Tudo que eu sabia era que as coisas estavam meio confusas ao meu redor. As pessoas pareciam se mexer em flashes de imagens, e não mais continuamente, os sons se tornaram um pouco mais abafados, mas apesar dos sintomas de embriaguez, eu me sentia lúcida o suficiente pra ouvir os urros de depressão que ainda vinham de dentro de mim por ter que estar ali. Tomei um gole da cerveja que tinha pedido, mas aquilo era como água pra mim agora, descia pela minha garganta sem fazer a menor diferença. Só aquilo de álcool não estava bastando pra abafar minha frustração.
Resolvi me levantar, com uma leve vertigem, e caminhei vagarosamente pelas pessoas, tentando não deixar que a música abafada por um zunido estranho em meu ouvido estourasse meus tímpanos. Não demorou muito e eu encontrei uma grande passagem para outro cômodo bem mais vazio e silencioso: a cozinha. Pouquíssimas pessoas estavam ali, bebendo tequila com limão numa rodinha, entre elas um menino de olhos verdes faiscantes e cabelos compridos queimados de sol. Assim que avancei na direção de um armário, em busca de alguma bebida mais forte, notei que seus olhos me acompanharam, brilhando de interesse. Bem que minha mãe dizia que aquele vestido caía bem em mim.
Soltei um suspiro frustrado ao ver que naquele armário só havia louças, e enquanto fechava suas portas, pensando no que fazer, senti alguém se aproximar de mim, trazendo um cheiro de praia consigo. Sorri disfarçadamente e me virei na direção da pessoa, dando de cara com aquele mesmo menino.
- Tá procurando bebida? - ele perguntou, com um sorriso galanteador nos lábios, e eu assenti devagar, me perdendo sem querer naquele verde intenso - Se gostar de tequila, pode beber com a gente.
Com um leve aceno de cabeça que fez sua franja bagunçada se mexer, ele indicou o grupo de amigos, todos meninos e igualmente bronzeados. Ergui as sobrancelhas, e por fim assenti novamente. Tudo pela tequila, e não porque o garoto de olhos verdes tinha um cheiro gostoso de protetor solar.
Senti o garoto me puxar pela mão até seus amigos, e sem nem fazer questão de apresentá-los, me estendeu uma dose de tequila e um gomo de limão. Nunca tinha tomado aquilo na vida, mas me esforcei ao máximo pra parecer experiente. Espremi o limão em meu pulso, e sem demora virei o copinho de bebida, sugando o líquido amargo em minha pele logo em seguida. Com os olhos fortemente fechados, senti aquela coisa arder e queimar dentro de mim, arranhando tudo por onde passava e formando lágrimas em meus olhos. Pelo menos o forte efeito da tequila me manteria entretida por mais algum tempo, ainda mais quando acompanhada de um par de belos olhos esmeralda.
- Mais uma pra garota aqui, Jimmy - ouvi o menino pedir a um de seus amigos, quando abri os olhos e vi tudo embaçado ao meu redor. O garoto sorriu pra mim antes de tomar sua dose, e sem querer eu também estava sorrindo, com mais um copinho cheio de tequila numa mão e um gomo de limão na outra.
De repente eu me sentia leve. As coisas já não me preocupavam mais, a pesada responsabilidade sobre minhas costas tinha evaporado, e eu já nem me lembrava da razão de estar naquela casa. Ninguém existia mais, só eu e os garotos estranhos que riam alto e falavam besteiras ao meu lado. De repente tudo era extremamente engraçado, de repente eu me vi rindo de qualquer coisa, mesmo quando não havia motivo pra rir, com uma mão insistentemente apoiada no braço do garoto de olhos verdes, que eu descobri que se chamava Paul. E desse mesmo jeito repentino, estávamos nós dois sozinhos na cozinha: eu sentada sobre a bancada da pia, e ele em pé ao meu lado, segurando vacilantemente a garrafa de tequila quase vazia entre seus dedos.
- Eu já não te conheço de algum lugar? - ouvi ele perguntar, com a voz arrastada, enquanto eu soltava mais uma de minhas risadas desconexas - Sério, eu acho que já te vi uma vez.
- Ah, é? - falei, erguendo uma sobrancelha sem tirar o sorriso débil do rosto e com a certeza inconsciente de que tinha bebido muito mais que o aconselhável - Onde?
Paul chegou mais perto, aproximando sua boca de meu ouvido, e respondeu num sussurro:
- Em algum dos meus sonhos.
Soltei uma gargalhada alta e mais lerda que o normal, demonstrando que eu ainda tinha senso do ridículo e não tinha deixado de achar graça de cantadas baratas.
- Então você deve estar sonhando agora, porque eu tenho certeza de que nunca te vi na vida, muito menos em sonho - respondi, com a voz levemente ácida de desprezo - Além do mais, eu sou comprometida.
- Com quem? - ele insistiu com um sorrisinho tonto, me segurando pelo braço com um pouco mais de força que o necessário quando eu fiz menção de me levantar - Quem sabe eu não conheço o sortudo?
- Tenho certeza de que você não o conhece - resmunguei, tentando me desvencilhar dele, sem muito sucesso devido à minha fraqueza provocada pelo álcool - Agora solta meu braço, tá me machucando.
- Relaxa, (S/N) - Paul pediu, sem me soltar, e eu já estava começando a me sentir realmente incomodada com aquele contato físico indesejado - Tá com medo de que eu te force a fazer alguma coisa, é?
- Me solta, por favor, Paul - implorei, olhando firmemente em seus olhos verdes semi-abertos - Eu quero ir embora.
- Ir embora? Agora? Mas por quê? - ele perguntou, ficando na minha frente e fazendo pressão com seus quadris contra meus joelhos fechados pra se encaixar entre minhas pernas - Logo agora que a gente ia começar a se conhecer melhor.
- Eu tô falando sério, me deixa sair daqui - falei, com a voz séria e um pouco mais alta que o normal, e quando minhas mãos foram na direção de seus ombros para afastá-lo de mim, suas mãos agarraram meus pulsos, praticamente me imobilizando, e fazendo com que a garrafa que ele segurava se espatifasse no chão - Me solta!
- Pára de resistir, eu sei que você também quer - ele sussurrou, chegando com seu rosto cada vez mais perto do meu apesar do meu recuo - Seu namorado não precisa saber.
Paul soltou meus pulsos e num milésimo de segundo suas duas mãos envolviam minha nuca e me puxavam na direção dele, tornando um beijo cada vez mais inevitável. Fechei os olhos, empurrando-o inutilmente pelo peito, e foi então que eu me lembrei do ponto fraco dos homens, e de que ele estava perfeitamente ao alcance dos meus joelhos.
Sem pensar duas vezes, dei uma joelhada caprichada em seus “documentos”, imediatamente fazendo-o cair ajoelhado na minha frente. Desci da bancada e desesperadamente saí da cozinha, me afastando ao máximo daquele cômodo. Eu sabia que não devia ter bebido tanto, era sensível demais a álcool. Pensei em explicar minha situação à Kelly na intenção de conseguir ir embora, mas tinha certeza absoluta de que ela faria questão de me entregar numa bandeja a Paul assim que ficasse sabendo do acontecido. Cambaleando, acabei me trancando num cômodo do andar de cima, e por sorte escolhi a porta certa: a do banheiro.
Me encarei no espelho, e soltei um suspiro tenso. Eu estava corada por causa do calor e da adrenalina, levemente suada e um pouco descabelada. Lavei o rosto calmamente com a água fria, ficando um pouco mais lúcida, e o enxuguei com a toalha de mão, pensando em um jeito de sair daquele inferno. Minha única saída era tentar convencer Kelly a me deixar ir embora, e determinada a fazer isso, respirei fundo e abri a porta do banheiro, dando de cara com um garoto curvado e com cara de dor que acabava de subir as escadas.
- Você! - Paul exclamou, andando depressa até mim com uma fúria repentina, e eu voltei pra dentro do banheiro na hora. Tentei fechar a porta, mas ele se lançou pesadamente contra ela, conseguindo entrar facilmente.
- Pelo amor de Deus, pára com isso, me deixa sair! - gritei, tremendo da cabeça aos pés enquanto ele avançava na minha direção.
- Agora você vai se ver comigo - ele rosnou, totalmente fora de si, e me prendeu violentamente contra a parede, forçando um beijo doloroso e segurando meus pulsos com força. Dessa vez eu realmente não tinha como me mexer, estava prensada entre seu corpo e o azulejo frio, e quanto mais eu me recusava a beijá-lo, mais ele insistia.
Mantive meus olhos arregalados, esperando que alguém passasse pelo corredor e ouvisse meus gritos abafados, e logo vi uma sombra passar, sem conseguir ver quem era. O grito fino que não encontrava espaço em minha boca saía pelo meu nariz, ainda mais alto agora que eu sabia que havia alguém ali, e me debati com mais energia, até que subitamente o corpo de Paul não estava mais ali. Em um segundo, ele tinha ido parar fora do banheiro, caído no chão com um baque surdo. Quando finalmente assimilei o que tinha acontecido, vi que havia alguém me puxando pela mão na direção do andar de baixo, e eu apenas segui, ofegante e apavorada demais pra tomar conta de mim mesma.
As imagens se passavam como fotos em minha mente: primeiro Kelly reclamando vigorosamente com a pessoa que me guiava, depois a porta da mansão dos Smithers se abrindo, a porta do carona de um carro que eu não conhecia aberta na minha frente, e por último eu sentada dentro desse mesmo carro, enquanto a pessoa que tinha me levado até lá entrava pela porta do motorista. Totalmente desnorteada, franzi a testa quando vi quem estava sentado do meu lado.
- Você está bem? - Niall perguntou, sem me olhar, enquanto colocava a chave na ignição. Não respondi nada, apenas continuei observando aquela cena. Eu ainda não acreditava que aquilo estava acontecendo, eu não acreditava que ele tinha realmente feito aquilo tudo, só podia ser invenção da minha cabeça. Não podia ser real, não fazia sentido ele ter me salvado.
- (S/N), você tá me ouvindo? - ele perguntou novamente, me encarando com firmeza. Por um segundo, tudo ficou ainda mais confuso quando aqueles olhos azuis se cravaram nos meus, mas depois as coisas pareceram voltar um pouco ao seu lugar, e eu consegui responder.
- Tô - murmurei, sentindo meu coração extremamente acelerado. Niall ficou alguns segundos em silêncio, apenas me encarando, e logo depois voltou a olhar pra frente, balançando negativamente a cabeça em tom de desaprovação.
- Você é doida de se meter num lugar desses - ele disse, cerrando os olhos por causa do farol alto de um carro que passou por nós - As festas da Kelly são mais perigosas do que parecem. Elas misturam as pessoas erradas e as desavisadas no mesmo ambiente, fazem com que os desencaixados logo achem uma confusão da qual não possam se livrar antes de se arrependerem.
Ele deu uma pausa, enquanto eu mantinha meus olhos bem abertos e fixos nele. Como se quisesse reforçar mais ainda seu aviso, Niall voltou a me encarar com uma conclusão:
- Aquela casa não é lugar pra você.
Sem esperar qualquer reação, ele arrancou com o carro, com a expressão fechada, e logo estávamos nos afastando rapidamente da mansão. Meus olhos teimavam em continuar presos a ele, tentando entender direito os últimos minutos. Por que ele tinha me livrado de Paul? Por que ele discutiu com Kelly antes de sairmos? E o principal...
- Pra onde está me levando? - ouvi minha própria voz perguntar, fraca, e só então senti que minha garganta ainda ardia pelo excesso de tequila.
- Eu pretendia te deixar na sua casa - Niall respondeu, sem me olhar, e sem saber por que, eu quis que ele o fizesse - Mas você é quem sabe onde prefere ficar.
- Na minha casa está ótimo - concordei, tentando não forçar muito minha voz, e convenci meus olhos a se afastarem dele, pairando desatentamente sobre a barra de meu vestido. Minha visão ficou embaçada subitamente, e em poucos segundos senti lágrimas escorrerem pelo meu rosto. Não sei por que comecei a chorar, talvez fosse efeito da bebedeira exagerada e todos os recentes e horríveis acontecimentos. Funguei baixinho, enxugando discretamente meu rosto com as costas das mãos e virei meu rosto pra janela do carro.
As luzes da cidade passavam como borrões pela minha visão, e se tornaram imóveis quando paramos num sinal vermelho. Mesmo sem poder vê-lo, senti seu olhar sobre mim, mas não o correspondi. Estava com vergonha por estar chorando, eu odiava chorar na frente dos outros, me sentia ridícula.
- Tem certeza de que está bem? - ele murmurou, e eu fechei os olhos na tentativa de parar de chorar - Aquele garoto machucou você?
Senti uma lágrima insistente rolar rapidamente e passar pelo canto de minha boca, fazendo o local arder um pouco. Passei a ponta da língua ali e senti gosto de sangue, mas apenas fiz que não com a cabeça, respondendo à sua pergunta com um sorrisinho miserável que ele não pôde ver. A ferida física mal podia ser comparada ao trauma emocional que Paul tinha me causado naquela noite.
- Se você não tivesse aparecido, ele teria conseguido me machucar - falei baixinho, e me virei lentamente em sua direção. Não sei por que, mas assim que meu olhar fraco encontrou o dele, sempre tão sólido, eu me senti segura. Era como se tudo realmente fosse ficar bem, eu não precisava mais ter medo. Por mais ameaçador que eu sabia que Niall podia ser quanto à minha relação com Hazza, eu também o via como uma espécie de protetor disfarçado, sempre nos lugares certos e nas horas certas pra me ajudar. Já era a segunda vez que ele me salvava de uma enrascada em menos de uma semana.
- Talvez não - ele discordou, erguendo as sobrancelhas por um momento - Você tem muita sorte, duvido que ele conseguisse.
O sinal ficou verde e Niall voltou a prestar atenção no trânsito. Abaixei meu olhar, com uma minúscula sombra de um sorriso triste no rosto, e suspirei profundamente. Aquele nem de longe parecia ser o mesmo Niall que eu conhecia.
- A sorte passa reto por mim há algum tempo - eu disse, meio que pra mim mesma, voltando a encarar meus joelhos com desânimo - Tudo que tem acontecido comigo são desastres, um atrás do outro... Um pior que o outro.
Niall não disse nada, apenas continuou dirigindo com a expressão dura. Sucumbi ao peso imaginário de minha cabeça, cuja dor eu ignorava há um bom tempo, e deitei-a no encosto do banco, fechando os olhos por um segundo.
E só voltei a abri-los quando a claridade do sol bateu em meu rosto, fazendo minha visão demorar mais ainda a entrar em foco. Num quarto estranho, numa cama estranha, e com uma voz conhecida.
- Bom dia, (seu sobrenome).
CONTINUA

Cáp. 08 - Fic. Biology

Respirei fundo, sentindo o aroma floral gostoso com o qual já estava acostumada. Toda vez que pisava na guarita do prédio de Hazza, o cheiro das flores do jardim invadia meus pulmões, geralmente fazendo um sorrisinho surgir em meu rosto. Mas hoje eu estava preocupada, ansiosa demais pra sorrir. Assim que me viu, Andy abriu a porta para mim, como em toda sexta-feira, e eu entrei, respirando fundo outra vez. Trêmula, passei por ele, que me deu um sorrisinho amigável por detrás do balcão da portaria, e subi pela escada, inquieta demais para esperar o elevador. Aquela poderia ser a última vez que eu estaria naquele prédio. Meu estômago revirou de nervosismo só de pensar.
Assim que o primeiro andar entrou no meu campo de visão, vi Hazza me esperando com a porta de seu apartamento aberta. Minha garganta ficou totalmente seca assim que seus olhos verdes me encararam.
Me aproximei da porta, com a respiração discretamente ofegante, mas sem nenhuma relação com os lances de escada que subi. Não soube como agir, até que ele abaixou o olhar e me deu espaço para passar. Com sérias dificuldades pra respirar de tão apreensiva, eu entrei e parei a alguns passos da porta, de costas pra ele, enquanto o ouvia trancá-la. Tomando coragem, me virei em sua direção, e o observei encarar o chão e prolongar aquele silêncio sepulcral por mais alguns segundos.
- Como você tá? – ouvi Hazza murmurar, com um pouco de cuidado na voz, e quase não soube responder, porque seu olhar se fixou no meu.
- Bem – respondi, com a voz falha, e pigarreei de leve para firmá-la – E você?
- Já estive melhor – ele falou, assentindo devagar e voltando a encarar os próprios pés. Mais silêncio.
- Não quer se sentar? – ele disse, me olhando novamente após mais algum tempo quieto, e indicou o sofá com um gesto de mão. Me sentindo uma visitante incômoda, fiz que não com a cabeça e esbocei um sorriso cordial, evitando olhar em seus olhos. Hazza respirou fundo, colocando as mãos nos bolsos da bermuda bege, e perguntou, com a voz baixa:
- Como foi a excursão?
Soltei um discreto risinho miserável ao ouvir sua pergunta, me lembrando de todos os péssimos momentos daquele dia. Nem que eu quisesse seria capaz de explicar o quão torturante aquela excursão tinha sido.
- O que você acha? – murmurei, encarando meus tênis com a expressão vazia – Não podia ter sido pior.
Hazza abaixou seu olhar, parecendo um pouco culpado pela minha resposta, e eu continuei:
- Ter que passar o dia inteiro com pessoas que eu não gosto e que também não gostam de mim, quase perder o chaveiro que minha avó me deu de presente, e pra encerrar com chave de ouro, quase ser assaltada enquanto esperava minha mãe ir me buscar na escola. Grande dia, sem dúvida.
- O que? Você quase foi assaltada? – Hazza repetiu, com a voz um pouco sobressaltada, e eu pude ver seu rosto demonstrar preocupação – Como assim?
Ergui meu olhar pra ele, e entortei a boca, balançando a cabeça negativamente.
- Não foi nada de mais – respondi, sem querer citar o momento em que o professor Horan apareceu e expulsou aquele cara estranho – Minha mãe chegou bem na hora e ficou tudo bem.
Hazza continuou me encarando, com o olhar meio aflito e a testa levemente franzida, e eu sustentei seu olhar, séria por fora e desmoronando por dentro. Tudo que eu queria naquele momento era abraçá-lo, só isso já me faria um bem enorme.
- Eu devia ter dado um jeito de ir com você – ele disse delicadamente, como se tentasse enxergar meus pensamentos através dos meus olhos – Evitaria muita dor de cabeça.
- Pois é – suspirei, sentindo minhas entranhas se revirarem de ansiedade dentro de mim ao ouvir seu tom de voz reconfortante. Se eu dissesse que estava lacrimejando, seria muito ridículo?
- Talvez se eu tivesse ido com a sua turma, nós não estivéssemos agindo como dois estranhos nesse exato momento – Hazza murmurou, com os olhos cravados nos meus de um jeito tristonho – Tudo isso por uma discussão que já não tem a mínima importância pra mim... Porque o que eu sinto por você é muito maior e mais especial do que isso.
Um sorriso tímido surgiu no meu rosto, derrubando duas lágrimas fujonas dos meus olhos. Alívio era pouco perto do que eu estava sentindo. Ele sorriu fraco pra mim, e toda aquela seriedade que existia antes sumiu de seus olhos instantaneamente, voltando a mostrar o Hazza maravilhoso que eu conhecia. O meu Hazza.
- Me desculpa – eu falei, com a voz embargada, e cobri meu rosto com as mãos, sentindo vergonha de mim mesma por estar chorando.
- Esquece isso, já passou - ouvi sua voz preocupada murmurar, bem perto do meu ouvido, me abraçando carinhosamente e me obrigando a inalar seu perfume viciante – Eu senti tanta saudade de você... Não conseguia te tirar da cabeça por um minuto sequer, me odiando por não ter simplesmente corrido atrás de você sem nem ligar pro que os outros iam pensar.
Àquela altura, eu já estava totalmente mole, ainda de pé somente porque ele me segurava. Era como se aquilo fosse um sonho. Hazza afundou seu rosto em meu pescoço, respirando profundamente meu perfume, e me deu um beijo atrás da orelha, provocando arrepios por todo o meu corpo. Logo depois, suas mãos envolveram meu rosto e o ergueram até nossos olhares se encontrarem. Encostando a ponta de seu nariz no meu, ele sussurrou, olhando fundo nos meus olhos com um sorrisinho lindo:
- Eu te amo, minha pequena.
Sorri novamente, fazendo com que duas últimas lágrimas teimosas, que ele logo enxugou com os polegares, rolassem pelo meu rosto. Passei minhas mãos ao redor de seu pescoço, com o sangue formigando dentro das veias, e venci a pouca distância que separava nossos lábios. Senti Hazza sorrir assim que nossas línguas se encontraram, sem a menor pressa de se afastarem, e ele envolveu minha cintura com seus braços. Deus, como era bom me sentir inteira novamente. Envolvi seu rosto com minhas mãos, matando a saudade de cada centímetro daquela região, e embrenhei meus dedos em seus cabelos, que estavam arrumados demais pro meu gosto. Senti meus pés saírem do chão quando Hazza me levantou, e dobrei minhas pernas pra trás, partindo o beijo e afundando meu rosto em seu pescoço. Sorrindo feito uma idiota, aproveitei a proximidade entre minha boca e seu ouvido para sussurrar:
- Você sabe que eu também te amo... Não sabe?
Hazza me colocou no chão novamente, e quando voltamos a nos encarar, vi que ele fingia pensar numa resposta, fazendo um biquinho fofo e olhando pra cima.
- Hm, não sei... Que tal refrescar a minha memória?
Um sorrisinho danado surgiu em seu rosto, o que só me fez sorrir mais ainda. Quase tinha me esquecido de como era bom estar com ele e de como ele me fazia rir com uma facilidade impressionante.
- Pode deixar que eu te faço lembrar direitinho, Styles – sussurrei, com meus lábios rentes aos dele num sorrisinho esperto e um olhar intenso em seus olhos verdes radiantes. Hazza colocou suas mãos em minha cintura e me puxou pra mais perto bruscamente, me beijando na mesma hora com uma vontade assustadora. Parecia que ele se lembrava muito bem, e estava mais do que disposto a me dar um flashback.
Suas mãos logo desceram mais um pouco, parando espalmadas em minha bunda, e as minhas deslizaram lentamente pelo seu tórax e abdômen, saboreando cada milímetro do trajeto. Hazza continuou descendo uma de suas mãos até a minha coxa, e a puxou pra cima, fazendo meu joelho ficar na altura de seu quadril. Entendendo o que ele queria (me carregar pra algum lugar, como sempre), eu subi novamente minhas mãos até seus ombros e me impulsionei pra cima, envolvendo sua cintura com minhas pernas. Agradecendo com gemidos baixos enquanto me beijava, ele deu alguns passos às cegas, segurando firme em minha bunda enquanto eu voltava a agarrar seus cabelos da nuca. Mais alguns passos adiante e eu estava sentada sobre algo plano. Tateei a superfície, enroscando meus dedos em alguns fios inesperados, e percebendo minha curiosidade, Hazza partiu o beijo e disse, com a boca avermelhada e um olhar meio enfezado:
- Quer fazer o favor de parar quieta?
Olhei pra baixo, e me vi sentada sobre a mesinha do telefone, que tinha sido empurrado pro lado e caído no sofá, deixando sobre a mesa apenas sua fiação. Ah, tá, agora eu entendi.
- Foi mal – murmurei, sorrindo sem graça pra ele, que revirou os olhos com um sorriso de canto e voltou a me beijar logo depois. Sem tempo a perder, enfiei minhas mãos por debaixo de sua blusa branca, tocando sua pele quente, e as deslizei até descobrir seu abdômen todo. Com uma das mãos, puxei-o pra mais perto pelo cós da bermuda, e ele resolveu tirar a blusa, puxando-a pra cima pela parte de trás e jogando-a longe em dois segundos. Assim que se aproximou novamente, Hazza avançou em meu pescoço, dando beijos e leves chupões pela região. Agarrei com mais força seus cabelos, enquanto fincava minhas unhas da outra mão em seus ombros divinos.
Ele continuou descendo seus beijos até meu colo e desabotoou um dos dois botões da minha camiseta preta, que só serviam pra regular o decote. Beijou de leve o local onde o botão cobria, e fez o mesmo com o segundo botão. Ele ergueu o olhar na minha direção, sorrindo pervertidamente, e depois suas mãos foram até o fecho do meu sutiã por baixo da blusa, levando-a junto. Tirei-a na mesma hora, com a ajuda desnecessária dele, e assim que ela voou pra algum lugar, sua boca estava grudada na minha novamente. Já bastante ofegante, eu acariciava seus braços e peito, sentindo seus dedinhos ágeis puxarem as alças de meu sutiã e fazendo-as escorregarem por meus ombros.
Com uma mão firme envolvendo sua nuca e mantendo seus lábios firmemente colados nos meus, eu lutava contra o botão de sua bermuda, que não queria abrir de jeito nenhum, com a outra mão. Pelo visto estávamos perdendo o jeito, porque Hazza também parecia estar com dificuldades com meu sutiã, mesmo usando as duas mãos para tirá-lo, até que ele se irritou e me afastou de leve.
- Resolve o meu problema que eu resolvo o seu, pode ser? – ele ofegou, atordoado, e eu assenti na hora, tirando o sutiã com facilidade enquanto via a bermuda dele descer até alcançar o chão. Achando graça do momento complicado, voltamos a nos beijar com um sorriso, e eu senti seu queridinho dar sinais empolgantes de vida mais embaixo. Abracei seu pescoço com mais força enquanto ele apertava meus seios e soltava alguns gemidos roucos, e passei a mordiscar e sugar o lóbulo de sua orelha com vontade.
Hazza subiu uma de suas mãos até minha nuca, agarrando meus cabelos, e passou a outra por debaixo da minha coxa, apertando seu interior e me puxando pra mais perto. Desci uma de minhas mãos até encontrar o volume que procurava, e fiz carinho de leve sobre a boxer, fazendo-o inspirar ruidosamente e buscar meus lábios com urgência. Ele podia ser bem exigente quando provocado. Assim que voltamos a nos beijar, sua mão contornou minha coxa, ficando sobre sua parte superior, e subiu até o botão da minha calça. Sem querer romper o beijo, mas com o mesmo problema de antes, ele tentava em vão abrir o botão, até que eu segurei suas mãos e o ajudei, com vontade de rir por vê-lo tão destrambelhado. Obstáculos vencidos, não demorou muito pra minha calça e calcinha estarem espalhadas pela sala.
Deslizando suas mãos desde o meu joelho até meu quadril, Hazza segurou meu rosto com uma delas, embrenhando as pontas de seus dedos em meus cabelos por trás da orelha, e com a outra tocou minha intimidade devagar. Ele me beijou na mesma hora, só pra me provocar mais ainda. Igualmente dedicado a me beijar e a mexer seus dedinhos mágicos, ele não demorou muito a me levar ao primeiro orgasmo do dia, sorrindo orgulhosamente depois do feito. Incrível como ele sabia exatamente onde investir pra me fazer pirar.
Sentindo algumas mechas de cabelo grudarem em minhas costas por estar suada, eu voltei a espalhar beijos por seu pescoço, porque hoje aquela área parecia estar especialmente perfumada. Me aproveitando da distração dele, minhas mãos foram descendo até encontrarem o elástico de sua boxer, e nem preciso dizer que ela já estava no chão em menos de dois segundos. Me afastei de seu pescoço e envolvi seu membro com uma mão, mantendo nossas testas unidas. Comecei a masturbá-lo rapidamente, sentindo Hazza apertar minhas coxas com força e afundar seu rosto em meu pescoço. Seus músculos do abdômen se contraíam enquanto eu acariciava sua nuca com a mão livre e beijava seu ombro, que estava próximo da minha boca. A respiração falha e quente dele no meu pescoço estava me arrepiando inteira, ainda mais quando ele começou a gemer baixo bem ao pé do meu ouvido.
Quando já estava nítido que ele se segurava pra não acabar com a festa, ele segurou seu pênis, me fazendo soltá-lo, e abriu a gaveta da mesinha, tirando um preservativo dela. Ele mesmo colocou a camisinha em tempo recorde, considerando-se que eu beijava seu pescoço feito uma desvairada, e me pegando de surpresa por sua rapidez, me penetrou de uma vez só e com força. Soltei um gemido alto, que logo foi abafado pela boca dele, e finquei minhas unhas em seus braços. Hazza continuou investindo rápida e furiosamente, gemendo contra meus lábios, e segurava firme em minha cintura, me puxando pra si a cada investida. Estávamos realmente urrando, suados e com os músculos totalmente tensos de prazer, até que nossos gemidos foram ficando cada vez mais cansados e ele finalmente gozou, agüentando até eu atingir meu segundo orgasmo.
De olhos fechados e com a testa unida à dele, eu apenas tentava recuperar o fôlego enquanto sentia sua respiração quente em meu rosto. Hazza acariciou de leve minha bochecha com uma mão, e eu abri os olhos, vendo um sorrisinho fofo surgir em seu rosto.
- Na mesinha do telefone, Hazza? – cochichei, rindo baixinho e mordendo meu lábio inferior dormente, fazendo-o revelar seus olhos intensamente brilhantes – De novo?
- Me desculpe, vou tentar me esforçar mais pra chegar ao sofá nas próximas vezes – ele murmurou, dando uma piscadinha marota e me dando um selinho demorado logo depois. É, acho que o dia ia ser bom.

- Hazza, eu tenho que ir.
- Ah, (Seu apelido), só mais um pouquinho, vai.
Estávamos deitados no sofá da sala, após uma tarde bastante, erm, empolgante. O corpo de Hazza estava sobre o meu, e suas mãos percorriam confortavelmente minhas coxas, quadris e cintura enquanto nos beijávamos. Já estávamos há um bom tempo ali, a ponto de deixá-lo “alegre” pela milésima vez no dia, mas eu realmente tinha que ir embora. Não que eu quisesse, por mim ficaria o resto da vida dando uns belos amassos em Hazza, mas se eu não chegasse em casa logo, minha mãe ficaria desconfiada pela demora.
- Eu tô falando sério – reforcei, tentando me sentar enquanto minhas mãos empurravam inutilmente seu peito pra trás e ele beijava meu pescoço de um jeito provocante – Eu preciso ir embora.
Ele soltou um suspiro derrotado, apoiando a testa em meu ombro, e eu quase voltei atrás, se ele já não estivesse de pé no segundo seguinte.
- Só você mesmo, (S/N) – ele resmungou, de pé na minha frente enquanto eu me sentava pra calçar meus tênis – Fica me atiçando e depois me dispensa? Não dá certo.
Olhei pra ele, mas meus olhos inevitavelmente se fixaram no volume que havia pelo caminho, mais especificamente em sua bermuda. Como eu já estava acostumada a vê-lo sem roupa, às vezes eu me esquecia de que aquilo podia chamar muita atenção quando ele estava vestido... E muito bem provocado, claro.
- Pelo amor de Deus, Styles, hoje você não pode reclamar de carência – eu ri, voltando a amarrar meus cadarços com um sorriso divertido – Já liberamos endorfinas suficientes pra uma semana só nessa tarde.
- Engraçadinha – Hazza falou, com a voz meio frustrada/irritada – Já vi que você realmente vai me deixar assim, então eu vou me conformar e buscar meus tênis.
- Pra que? – perguntei, quando o vi caminhar na direção de seu quarto – Vai me levar até lá embaixo hoje?
- Você acha mesmo que eu vou te deixar ir andando sozinha a essa hora? – ouvi sua voz exclamar lá de dentro, como se andar até a minha casa lá pelas 8 da noite fosse um absurdo – Eu vou te levar!
- Claro que não, Hazza! – neguei, ficando de pé quando terminei de calçar meus tênis e seguindo-o depois – Nem pensar, é arriscado demais! Imagina se minha mãe ou alguém conhecido nos vê?
- Não acho que ninguém vá nos ver, mas se acontecer, o que tem de mais nisso? – ele disse enquanto calçava rapidamente os tênis, como se nossa relação fosse totalmente permitida – Um professor não pode dar uma carona pra uma aluna que encontrou totalmente por acaso na rua?
Revirei meus olhos, com um leve sorriso contrariado, e ele logo veio até mim com uma expressão esperta.
- Se você insiste... – murmurei, encarando-o com o olhar derrotado. Ele sempre me convencia, sempre me fazia ceder ao seu jeito seguro e despreocupado, e o pior, extremamente lindo.
- Sim, eu insisto – Hazza retrucou, cerrando os olhos e franzindo rapidamente o nariz antes de me dar um beijo demorado. Os minutos foram passando (aliás, voando), a gente continuou se beijando, e assim que ele me prensou contra a parede do corredor, me dei conta de que aquilo estava durando demais e estava tomando um rumo que não devia tomar.
- Desculpa, eu me empolguei um pouquinho – ele sussurrou, abrindo devagar os olhos e me fazendo sorrir feito uma idiota quando eu o afastei pelo peito. Mesmo depois de quase dois meses juntos, ele ainda me fazia sorrir sem esforço.
- É, eu percebi, você tá que tá hoje – brinquei, lançando um breve olhar pro retorno do insistente volume em sua bermuda antes de dar as costas pra um Hazza desconcertado – Vamos?
Descemos as escadas rapidamente, sem esquecer de nos despedirmos de Andy, e caminhamos até o carro de Hazza, que estava estacionado bem em frente ao prédio. Rezando pra ninguém nos ver, entrei no carro pela porta do carona enquanto ele fazia o mesmo do outro lado, com um sorriso insistente de quem estava levando a namorada (ou sei lá o que eu era dele) pra casa pela primeira vez. Ele lançou um olhar de dúvida pra ignição do carro e subitamente começou a tatear os bolsos da bermuda, procurando alguma coisa.
- Droga – ele xingou, entortando a boca e desistindo de revirar seus bolsos – Esqueci a chave.
- Não acredito – falei, revirando os olhos e rindo de um jeito apreensivo por estar aparecendo com ele em público. Olhava pra todas as direções, preocupada com as poucas pessoas que passavam pela rua e o que elas poderiam pensar.
- Viu o que você faz comigo? Me deixa todo desconcentrado – ele murmurou, com sua típica cara brincalhona de insatisfação enquanto saía do carro – Já volto.
Assim que Hazza sumiu pela portaria do prédio, eu me deixei escorregar no assento do carro, praticamente sumindo de vista. Apesar de ter olhado pra todos os lados possíveis e não ter visto quase ninguém na rua, eu não queria correr o risco de ser vista por gente demais, ou pelas pessoas erradas.
Encarando vagamente a barra de minha blusa, com a qual eu brincava com a mesma atenção, eu esperei, até ouvir leves batidas no vidro ao meu lado poucos segundos depois. Pulei de susto com o barulho repentino, e senti todo o sangue do meu corpo evaporar quando olhei na direção do som.
Meu olhar se fixou nos olhos irritantemente verdes de Kelly Smithers do outro lado do vidro, que sorria pra mim com seu cinismo cotidiano. Não sei descrever o que se passava dentro de mim naquele momento, só sei que foi um dos piores sentimentos que eu já tive, como se tudo dentro de mim estivesse desmoronando. Ela não podia estar ali, ela não podia ter me visto, ela simplesmente não podia.
Quando eu pensei que ainda havia uma chance de driblar aquela situação, vi que havia uma meia dúzia de garotas igualmente patricinhas do outro lado da rua cochichando e rindo entre si enquanto nos observavam, algumas até fotografando a cena com a câmera de seus celulares caríssimos. Amigas dela, que também me conheciam de vista porque estudavam no mesmo colégio. Maravilha, eu realmente estava encurralada.
- Desce o vidro, quero falar com você – ouvi a voz de Kelly pedir, abafada pela porta fechada entre nós. Tentei me mexer ou fazer algo básico como respirar, mas não deu. Eu estava totalmente paralisada, dura de pavor. Ela era só fruto da minha imaginação. Só podia ser.
Levei alguns segundos assimilando a situação, e como Kelly continuou parada do meu lado e não sumiu como uma miragem normal, eu fiz a única coisa que podia fazer: abaixei o vidro, com o olhar trêmulo. Já era, ferrou tudo. Ela e suas amiguinhas iam mostrar fotos minhas no carro de Hazza pra diretora, ela chamaria minha mãe e aí minha vida estava acabada. Já dava até pra me ver mudando de escola e sendo tachada de piranha pro resto da vida.
- Ora, ora, vejam só o que temos aqui – Kelly sorriu maleficamente, apoiando levemente um cotovelo no retrovisor do carro – (S/N) (seu sobrenome) no carro de Harry Styles... Por essa eu não esperava... Bom, talvez eu até já esperasse.
O grupinho de garotas a la Gossip Girl do outro lado da rua começou a rir, e eu senti meu sangue voltar às veias, concentrando-se especificamente em minhas bochechas e deixando-as insuportavelmente quentes, chegando até a confundir meus pensamentos.
- O que você quer? – gaguejei, meio tonta por causa da pressão enorme que eu sentia dentro da cabeça, que atendia pelo nome de pânico. Vi o sorriso de Kelly alargar, como se tivesse gostado da pergunta, e seu olhar maldoso se tornou ainda mais intenso.
- Amanhã eu vou dar uma festinha na minha casa – ela murmurou, aproximando mais um pouco seu rosto do meu para se fazer ouvir – Aparece lá e a gente conversa.
Ela voltou a se afastar, mexendo em sua bolsa, e de lá tirou um cartão em branco e uma caneta. Anotou rapidamente seu endereço no papel retangular e me deu.
- Se eu fosse você, não deixava de ir – ela disse, piscando maliciosamente pra mim enquanto se afastava e levava seu bandinho risonho consigo. Eu apenas a observei se afastar, gargalhando e vendo alguma coisa nos celulares das amigas, provavelmente fotos da minha cara horrorizada. Totalmente confusa e assustada, abaixei meu olhar pro cartão, onde a caligrafia redondinha de Kelly reluzia graças à tinta cintilante da caneta gel rosa dela. Eu precisava achar uma maneira de contornar aquela situação, e eu tinha cerca de 24h pra pensar numa boa proposta.
Olhei desanimadamente na direção do prédio de Hazza, e o vi passar depressa pelo balcão e rir de alguma coisa com Andy. Rapidamente escondi o cartão de Kelly no bolso da calça, e assim que ele entrou no carro, forcei um sorrisinho simpático. Não queria que ele soubesse desse inconveniente, não por enquanto. Ele colocou a chave na ignição e me olhou, provavelmente notando meu jeito estranho. Não era preciso muito tempo de convivência comigo pra saber classificar meu estado de humor.
- Que foi, (Seu apelido)? – Hazza murmurou, com a expressão e a voz levemente preocupada – Você tá branca feito papel.
- Não foi nada – respondi, balançando negativamente a cabeça e me esforçando ao máximo pra parecer normal – Eu só tô meio cansada... Acho que preciso dormir um pouco.
Ele continuou me encarando, com a testa franzida, e por um segundo pensei que ele não cairia na minha mentira. Mas tudo que Hazza fez foi dar de ombros e arrancar com o carro, alheio a qualquer tipo de acontecimento perigoso. Como sempre.

CONTINUA 

Cáp. 07 - Fic. Biology

Cinco e quarenta e dois. Esse era o horário que meu celular marcava quando pisei no Starbucks, já de volta a Londres. Geralmente após as excursões, a turma era levada até lá pra tomar um lanche e relaxar um pouco após um dia de aprendizado fora da escola. Meu momento de relaxar baseou-se em ficar sentada numa das mesas mais isoladas de todos, com um frapuccino que minha garganta não queria engolir entre meus dedos gelados e a cabeça pesada. Meu dia tinha sido um lixo, um dos piores da minha vida, sem dúvida.
Encarando a paisagem cinza e chuvosa que havia do lado de fora pela janela de vidro ao meu lado, eu brincava com o canudo do milkshake praticamente intocado, sentindo um mau humor gigante urrando dentro de mim. Meu estômago demonstrava fome, mas eu não tinha vontade nem capacidade de comer ou beber alguma coisa. Com um cotovelo apoiado na mesa e a cabeça apoiada na mão, enquanto a outra se distraía com o copo, eu mantinha meu maxilar tenso, sem nem notar o ser que se aproximava devagar.
Vi alguém se sentar na cadeira à minha frente, e sem nem precisar mover meus globos oculares, reconheci o indivíduo como sendo Niall Horan. Falta de sexo dava em perseguição desesperada, só podia ser. Sem dizer nada, ele ficou me encarando, com as mãos no colo e um sorrisinho insuportável. Incomodada com a presença dele, desviei meu olhar dos pingos de chuva que escorriam pelo vidro da janela até encontrar o dele.
- Perdeu alguma coisa? – resmunguei, sem mexer mais nada além dos meus músculos faciais. Niall continuou com seu sorrisinho divertido antes de erguer uma de suas mãos sobre a mesa, fechada num punho, e responder:
- Eu não, mas eu acho que você sim.
Franzi a testa, sem nem tentar entender, e ele abriu a mão, deixando uma coisa rosa clara pender de uma pequena corrente prateada entre seus dedos polegar e indicador unidos. O meu chaveiro.
Senti meus olhos se arregalarem e meu queixo cair na hora em que vi a bailarina balançando de leve bem na minha frente. Imediatamente, arranquei-a da mão dele, segurando-a com firmeza enquanto a observava por alguns segundos, e logo depois a coloquei dentro da bolsa.
- Quer dizer que ela estava com você desde o começo – murmurei, morrendo de raiva, quando voltei a encará-lo – Por que você não me devolveu assim que soube de quem era?
- Sua criatividade me comove, (seu sobrenome) – ele disse, rindo da minha cara – Pra que eu ia querer ficar com o seu chaveiro? Foi o Hammings que o encontrou e só me deu agora, por isso eu vim devolver.
Continuei encarando-o, sem saber se acreditava ou não. Preferi não ocupar minha mente com aquele assunto, já estava tudo resolvido, meu chaveiro estava comigo de novo e eu pouco me importava se ele estava dizendo a verdade ou não. Ele era um imbecil de marca maior e estar sendo sincero não o faria menos desprezível.
- Obrigada, se era isso que você queria – resmunguei, grossa, voltando a encarar a paisagem lá fora. Que estado calamitoso eu havia atingido, era capaz até de agradecê-lo pra vê-lo longe de mim.
- Eu quero bem mais de você – ouvi o professor Horan murmurar, com os olhos cravados em mim – Sei que minha vez vai chegar, e tenho paciência pra esperar.
Sem dizer mais nada, ele se levantou e voltou a se sentar em sua mesa junto com o professor Hammings, finalmente me deixando sozinha com meus pensamentos, e com um ódio cada vez maior dele. Se antes daquela excursão eu já estava decidida a contar tudo sobre o Horan pra Hazza, agora eu não perderia a chance de fazê-lo o mais breve possível.

- Mãe, cadê você?
Seis horas e cinqüenta e três minutos. Eu estava parada na porta da escola, quase congelando de frio, falando com minha querida e pontual mãe ao celular. Por que raios ela não estava parada na frente do colégio pra me levar pra casa se a porcaria da excursão estava prevista pra acabar às seis e meia? Quase meia hora de atraso, bem típico de mamãe mesmo.
- Desculpe o atraso, filha, acabei cochilando e perdi a hora – ela respondeu, parecendo um tanto afobada do outro lado da linha – Já estou indo te buscar, querida, não demoro.
- Não demore mesmo, por favor – murmurei, ao ver que não havia mais sombra de nenhum aluno na porta da escola. Fechei o slide do celular lentamente, com frio demais pra me mover mais rápido que aquilo. Depois de toda aquela chuvinha fraca irritante e incessante, veio um frio que ninguém estava esperando, acompanhado de uma escuridão precoce que dava a impressão de que já eram nove da noite. Todos deixaram o ônibus encolhidos e buscando o ambiente agradável de dentro dos carros dos pais. Só eu tinha que me conformar com mais alguns minutos de espera, sentindo a ponta de meus dedos dos pés e das mãos perderem a sensibilidade, meu nariz ficar gelado e ver minha respiração virar fumaça assim que entrava em contato com o ambiente. Legal, mãe, obrigada por se lembrar de mim.
Distraída com os poucos carros que passavam pela rua, nem percebi quando uma pessoa se aproximou de mim, e assim que notei sua presença, ergui meu olhar até o dela.
- Oi, gatinha – um garoto que eu não fazia a idéia de quem era disse, com um sorriso nada agradável no rosto e me olhando de cima a baixo. Ele devia ter uns 19 anos, alto, magro e com dentes muito amarelos. Usava um conjunto de moletom azul marinho que parecia ser três vezes maior que ele, tênis de basquete e uma touca cinza que fazia sua cabeça parecer deformada, junto com uma barba por fazer que só aumentava a impressão de sujo que o bafo de cerveja já o dava.
Engoli em seco novamente, sentindo meu coração acelerar e a boca secar. Droga, ele ia me roubar. Olhei em volta, e tudo que vi foi o sr. Hammings arrancando com seu carro sem nem notar minha existência. Busquei desesperadamente algum sinal de vida naquela rua fora nós dois, mas não encontrei. Legal, eu estava definitivamente sozinha com aquele cara estranho enquanto minha mãe não chegasse. Fechei minha mão discretamente, tentando esconder meu celular, o que foi em vão, já que ele logo olhou naquela direção e aumentou seu sorriso pervertido.
- Que foi, tá com medo, gata? – ele riu, voltando a me encarar com a voz arrastada de quem tinha tomado um belo porre – Fica com medinho não, o papai aqui não vai te fazer mal.
Dei um passo pra trás na direção da porta da escola, tentando não demonstrar meu medo, mas o garoto me acompanhou, dando um passo na minha direção ao mesmo tempo. Que merda, eu não queria ser assaltada, muito menos estuprada, hipótese que me amedrontava mais que qualquer coisa só pelo simples fato de pensar nela.
- Eu não te conheço – falei, com a voz trêmula de medo – Vai embora, por favor.
- Não me conhece, mas pode conhecer – ele sorriu, dando mais um passo na minha direção e ficando a uma distância muito desconfortável – Não vou deixar uma gata dessas sozinha aqui a essa hora.
- Pode ficar tranqüilo, ela não tá sozinha – ouvi uma voz firme atrás de mim, e logo depois um braço envolveu meus ombros com a mesma firmeza – Eu tô com ela, não precisa se preocupar.
Acho que nunca me senti tão bem por ter Niall Horan por perto. O cara estranho arregalou levemente os olhos ao vê-lo sair do colégio e se aproximar de mim, e seu sorrisinho simplesmente desapareceu de seu rosto, dando lugar a um certo pânico.
- Ah... Não sabia que a moça tava acompanhada – ele balbuciou, dando discretos passos pra trás.
- Pois é, mas agora sabe - o sr. Horan disse, sem perder a firmeza na voz – Pode ir tomando seu rumo.
Sem dizer mais nada, o garoto assentiu depressa, um pouco assustado pela atitude intimidante do sr. Horan, e saiu andando sem nem olhar pra trás. Continuei paralisada onde estava, seguindo-o com o olhar até perdê-lo de vista, e só então consegui respirar novamente.
- Você conhece esse rapaz? – Niall perguntou, ainda me abraçando firmemente. Ergui meu olhar até ele, que estava com a expressão fechada e os olhos fixos na direção que o rapaz tomou, e respondi, inalando sem querer o perfume que eu tentei evitar o dia inteiro:
- Nunca o vi na vida.
Ele assentiu devagar e me olhou, sem mudar de expressão. Meu cérebro entrou em conflito com meu coração assim que os traços do professor Horan, mal iluminados pela luz fraca da rua, entraram no meu campo de visão, devido aos meus batimentos cardíacos subitamente acelerados. Eu já sabia que ele era bonito, mas talvez a gratidão por ele ter aparecido e afastado aquele cara o estavam tornando ainda mais lindo naquele momento.
- Aqui é muito perigoso quando escurece – ele falou, com a voz de um pai super protetor dando sermão na filha – Cadê a sua mãe?
- J-já tá vindo – gaguejei, meio distraída com o rosto dele (me deixa, ele nunca tinha feito aquela cara de preocupado pra mim antes, dá uma trégua) – O que o senhor ainda tava fazendo aqui?
- Fui até o meu armário buscar uns relatórios que tenho que corrigir pra amanhã - ele respondeu, voltando a olhar pra rua com certa impaciência – Sabe se sua mãe vai demorar?
- Ela já está no caminho, logo chega – eu disse, desviando meu olhar dele pra ponta de meus tênis levemente sujos de terra.
- É melhor ela não demorar mesmo, tô morrendo de frio aqui – o sr. Horan comentou, com as sobrancelhas erguidas num tom autoritário. Ergui meu olhar pra ele novamente após alguns segundos de silêncio, inconformada com a capacidade que ele tinha de ser desagradável em todos os momentos.
- Não pedi pra você ficar – falei, mesmo sabendo que era realmente perigoso ficar sozinha ali àquela hora – Pode ir embora se quiser.
Niall soltou um risinho debochado e me olhou, parecendo indignado com a minha resposta atravessada.
- Não sei por que eu ainda perco meu tempo com você, (seu sobrenome) – ele riu, sem humor algum, e tirou seu braço dos meus ombros com certa violência. Me encolhi um pouco, sentindo o vento frio voltar a soprar na região onde antes o casaco quentinho dele cobria, e o observei se afastar, indo em direção à sua moto, estacionada perto de uma árvore que só deixava seu pneu dianteiro visível de onde eu estava. Não acredito que ele estava mesmo indo embora. Cagão.
Ele colocou o capacete pelo caminho e não demorou a arrancar com a moto, realmente me deixando sozinha naquela rua mal iluminada e fria. A simples hipótese de agradecê-lo por ter afastado aquele marginal, que tinha crescido um pouco, tornou-se totalmente inaceitável de novo. Idiota, bunda mole, grosso, sem educação. Hazza jamais me deixaria sozinha naquele lugar, tenho certeza.
Só de pensar em Hazza, soltei um suspiro chateado, fazendo uma grande quantidade de fumaça sair de minha boca. Abracei meu próprio corpo, tentando inutilmente fazer aquele frio passar, mas isso seria impossível com apenas uma blusinha fina de malha. Encarei a rua, desesperada para encontrar minha mãe, e assim fiquei por alguns minutos, até ver os faróis do Land Rover dela surgirem em meio à quase escuridão. Suspirei novamente, aliviada, e assim que me aproximei da rua, vi um farol se acender bem ao meu lado, atrás daquela mesma árvore onde antes estava a moto do sr. Horan. Olhei naquela direção, parando de andar ao reconhecer a mesma moto que estava estacionada ali há minutos atrás, e vi um homem de capacete olhando pra mim, com seus olhos azuis refletindo intensamente a luminosidade do farol. Franzi a testa, sem entender por que ele tinha voltado, e cerrei meus olhos, reprimindo com todas as minhas forças os batimentos novamente acelerados de meu coração e continuando o caminho até o carro de mamãe.
- Desculpe a demora de novo – ouvi minha mãe dizer, enquanto eu entrava no veículo e sentia o alívio da temperatura agradável do seu interior - Quem era aquele na moto, querida?
Olhei na direção da moto do sr. Horan, que arrancava novamente à nossa frente e se afastava depressa, e abaixei meu olhar pra colocar o cinto de segurança, respondendo sua pergunta num murmúrio seco:
- Ninguém, mãe.

- Que bom ver que você sobreviveu aos mosquitos-azeitona! – Eleanor riu, estirando seus braços na minha direção assim que cheguei à escola no dia seguinte.
- Eu preferia ter que enfrentar mosquitos gigantes a passar pelo dia de ontem outra vez – falei, rindo da minha própria desgraça ao retribuir o abraço carinhoso dela.
- Credo, (S/N), vira essa boca pra lá – ela reclamou, espalmando uma mão em minha bochecha e empurrando devagar meu rosto para o lado oposto como se fosse um tapa, quando nos afastamos – Depois vira ela de volta pra cá e conta tudo. Como é que foi ontem?
Relatei os (deploráveis) acontecimentos do dia anterior pra Eleanor em alguns minutos, e assim que terminei de contar, ela não demonstrou reação, apenas fixou seu olhar em algum ponto atrás de mim.
- Que foi, criatura? – perguntei, meio assustada, e me virei na direção de seu olhar. Dei de cara com um suéter verde musgo se aproximando cada vez mais, e numa fração de segundo, meu coração deu dois giros de 360 graus dentro do meu peito. Tentei respirar à medida que nossos olhares se cruzaram e se fixaram um no outro, mas por mais esforço que eu fizesse, não consegui oxigenar meus pulmões. Tudo que fui capaz de fazer foi continuar encarando Hazza, que se aproximava cada vez mais com uma expressão tensa e olhinhos cansados, até me dar conta de que ele estava parado na minha frente.
- Erm... Bom dia, Calder – ele murmurou, dirigindo-se à Eleanor com um sorrisinho nervoso, e abaixando mais ainda seu tom de voz quando se referiu a mim - Oi, (seu apelido).
- Oi, sr. Styles – falei, sem emoção (só aparentemente), enquanto Eleanor apenas sorriu fraco e respondeu seu cumprimento com um aceno de cabeça. Pude ver no olhar de Hazza que ele não tinha gostado muito do jeito pelo qual eu o chamei, mas mantive a seriedade. Ainda não sabia onde estava pisando com ele, era melhor me manter com um pé atrás.
Sem dizer mais nada, Hazza apenas me entregou um pedaço pequeno de papel dobrado com o qual ele estava brincando apreensivamente desde que tinha pisado na escola, e assim que eu o peguei de sua mão, recebi um sorriso fraco antes de vê-lo se afastar em direção à sala dos professores. Fiquei observando-o entrar na sala, com a expressão vazia, e se Eleanor não tivesse me cutucado, acho que teria ficado encarando a porta daquela sala pelo resto da vida.
- Tá esperando o que pra ler o bilhete, (S/N)? – ela sussurrou, com um sorriso empolgado, e eu desdobrei o pedaço de papel pautado que estava em minhas mãos.

Te vejo lá em casa mais tarde? xx

O sinal tocou, iniciando mais uma sexta-feira de aula, assim que eu bati os olhos naquela frase, e em questão de segundos um sorriso aliviado surgiu em meu rosto. Sei lá, acho que as frustrações da excursão de ontem e tudo que vinha dando errado na minha vida de uns dias pra cá estavam me deixando sufocada, e agora que existia uma pontinha de esperança nadando contra a maré de azar, foi impossível controlar o alívio. Ergui meu olhar do papel para Eleanor, que ostentava uma expressão boba e maravilhada, e meu sorriso se abriu ainda mais.
- Eu não falei que ele ia te chamar? – ela disse baixinho, e pela primeira vez em dois dias inteiros, eu consegui rir de verdade. Uma sensação de leveza percorria meu corpo, me fazendo querer rir e chorar ao mesmo tempo. Eu sabia que só porque ele tinha me chamado pra ir à casa dele não significava que tudo estava bem entre nós de novo, mas já era um começo, certo?
Continuei sorrindo pra Eleanor, que me abraçou de lado, e começamos a caminhar lentamente até o portão de entrada da escola. Pelo visto hoje o dia seria um pouco melhor do que os outros. Era tudo que eu queria e tudo que eu precisava.

- Você vai, certo? – Eleanor perguntou, com o olhar perdido, enquanto ouvíamos música no intervalo.
- Claro que vou, tudo que eu quero é acabar com isso de uma vez por todas – respondi, observando um grupo de garotas do primeiro ano rirem escandalosamente por algum motivo que eu não estava interessada em saber.
- E você vai contar tudo sobre o Horan também, certo? – ela disse, virando-se pra me encarar com a expressão firme. Assenti devagar, engolindo em seco, mas não consegui segurar as dúvidas que ocupavam minha mente.
- Na verdade, eu não sei – falei, fechando os olhos e fazendo uma careta quando vi a cara de pânico que ela fez – Quer dizer, se nós conversarmos e ficar tudo bem, não vou nem querer lembrar que o Horan existe!
Eu realmente não queria tocar no assunto Niall Horan se tudo se acertasse como eu esperava. Ficar falando de outro homem, ainda mais de um que eu odiava e era melhor amigo dele, não era o que eu mais gostaria de fazer com Hazza. Além do mais, o Horan tinha me feito um grande favor ontem, mesmo que daquele seu jeito idiota lifestyle, ou seja, parecia que ele estava tentando ser menos estúpido comigo depois que percebeu que eu também podia ser uma ameaça a ele. Seria mais fácil continuar a travar aquela briga por debaixo dos lençóis com o sr. Horan do que chutar o pau da barraca e talvez fazer Hazza tomar alguma atitude precipitada ou arriscada. Eu realmente morria de medo da reação dele quando descobrisse a verdade sobre Niall.
- (S/N), deixa de ser idiota pelo menos uma vez na vida e me escuta! – ela exclamou, até desligando o iPod pra ser ouvida com clareza – Até quando você pretende continuar nessa de querer fingir que o Horan não existe e não significa perigo pra vocês dois, hein? Porque eu não sei se você já reparou, mas o sr. Styles não age assim, e na primeira abobrinha que o Horan falar de você, tchau romance perfeito!
- Eu sei, Eleanor – suspirei, erguendo as sobrancelhas ainda de olhos fechados – Repetir isso não vai adiantar nada, eu pensei nesse assunto durante aquela maldita excursão inteira.
- É mesmo? Pois então perdeu seu tempo, porque se sabe o que tem que fazer e até agora não tem certeza de que atitude vai tomar, não valeu a pena pensar tanto assim – ela retrucou, desviando seu olhar do meu com irritação.
Um silêncio meio tenso tomou conta de nós, quebrado apenas pela música que Eleanor voltou a colocar pra tocar no iPod. Nós duas observávamos as pessoas que andavam pelo pátio do colégio, e poucos minutos depois, reconheci o sr. Styles e o sr. Horan saindo da sala dos professores juntos. Fixei meu olhar neles, assim como Eleanor, e vi os dois caminharem até a saída da escola para tomar lanche numa padaria que ficava na esquina, como sempre, sem nem sequer notar nossa existência ali perto. Pareciam compenetrados em algum assunto sério, pois ambos tinham a testa franzida e o olhar preocupado. Aquela preocupação que eu vi pela primeira vez ontem nos olhos do sr. Horan, que deixava seus olhos ainda mais intensos. Tá, isso não me interessa.
- Sabe de uma coisa? – Eleanor disse, quando eles sumiram de nossa visão, e eu me virei pra ela – Mesmo ele sendo o péssimo exemplo de ser humano que ele é, eu ainda acho que você devia agradecê-lo por ter afastado aquele cara de você ontem.
Voltei a olhar na direção da rua, soltando o trilhonésimo suspiro preocupado em três dias. E sabe o que era o pior de tudo? Ela estava certa. Por mais cachorro que ele fosse, eu não podia negar que devia agradecimentos a Niall Horan.

- Belo relatório, Kristen.
Final da última aula. Passei pela porta do laboratório de biologia, sem realmente acreditar no que estava prestes a fazer. Só de ouvir aquela voz constantemente metida, já me dava vontade de dar meia volta e ir embora. Mas já era tarde demais, eu já estava dentro do laboratório, parada ao lado de um dos três grandes balcões que haviam lá, esperando até que a tal Kristen fosse embora. Quanto menos gente soubesse que eu tinha qualquer tipo de contato com Niall Horan fora do horário das aulas, melhor.
A tal garota deixou a classe com um sorrisinho malicioso, e me olhando de cima a baixo ainda por cima, como se eu fosse como ela e topasse ir pra cama com aquele cafajeste. Evitei olhar pra garota, sentindo que voaria no pescocinho dela se não me controlasse, e logo ouvi a voz do sr. Horan dizer.
- Você por aqui, (seu sobrenome)? A que devo a honra?
Olhei pra ele, que estava sentado em sua cadeira organizando várias pilhas de papéis, provavelmente relatórios, que estavam sobre sua mesa.
- Não acredito que eu vou realmente dizer isso, mas... Eu vim te agradecer pelo que você fez por mim ontem depois da excursão – falei, decidindo ser direta e objetiva pra gastar menos do meu tempo me humilhando pra ele. Niall nem ergueu o olhar dos relatórios, apenas sorriu maliciosamente e disse:
- Não precisava ficar sem graça, a maioria das garotas também costuma voltar pra agradecer pelos grandes favores que eu faço por elas.
Entendendo o verdadeiro sentido da palavra “favores” sem dificuldade, cerrei meus olhos fixos nele, com uma expressão que ficava entre a incredulidade e o desprezo. Que homem ridículo. Nunca senti tanta raiva de mim mesma por ter ido atrás dele. Devia ter sido tão inescrupulosa quanto ele e simplesmente ignorar o fato de que uma vez na vida ele me fez um favor.
- Eu realmente não sei por que fiquei surpresa com essa resposta – eu retruquei, com um risinho inconformado no rosto – Só posso ser muito idiota mesmo.
Dei meia volta pra ir embora, mas assim que dei um passo na direção da porta, ouvi a voz de Niall voltar a falar, com um inesperado toque de sinceridade.
- Foi muito educado da sua parte vir até aqui me agradecer, (seu sobrenome). Confesso que você me surpreendeu... Mais uma vez.
Me virei novamente pra ele, e um certo arrepio percorreu minha espinha quando meu olhar encontrou o dele, tão intenso sobre mim. De um jeito diferente do que eu tinha descoberto ontem. Ainda mais invasivo, imponente, vidrado, como se eu fosse a única coisa que houvesse pra se olhar na vida dele.
- Por que você voltou ontem? – ouvi minha própria voz perguntar, com o olhar grudado no dele por alguma razão que eu não sabia explicar. Aquela dúvida estava entalada na minha garganta desde que o vi novamente estacionado atrás daquela árvore, como se estivesse tomando conta de mim às escondidas. Os olhos de Niall continuaram fixos nos meus, ainda mais intensos que antes, até que um sorrisinho de canto surgiu em seu rosto e ele respondeu:
- Curiosidade.
Franzi a testa, sem entender, e ele explicou melhor:
- Queria saber se sua mãe era tão bonita quanto você. E pra falar a verdade, seu pai é um homem de sorte.
Cerrei novamente meus olhos, encarando-o sem acreditar no que tinha acabado de ouvir. Eu sabia que ele era grosseiro, mas não achei que fosse capaz de usar cantadas daquele tipo. Só havia um tipo de homem que podia usar cantadas como aquelas no mundo: homens como Harry Styles, por exemplo. Caras como Hazza eram capazes de transformar cantadas toscas como aquela em música para os ouvidos de qualquer mulher apenas com seu olhar e jeito de falar.
- Eu quase achei que você tava conseguindo falar sério pela primeira vez na vida – murmurei, olhando-o com uma decepção irônica – Mas me lembrei de que milagres não acontecem.
Pude ver o sorriso do professor Horan se alargar um pouquinho com a minha resposta, realmente achando graça do que eu tinha dito. Me virei novamente na direção da porta, e deixei o laboratório, descendo rapidamente os lances de escada rumo à saída da escola. E por incrível que pareça, eu estava rindo. Uma coisa era certa: Niall Horan pode reunir todos os defeitos que alguém pode ter, mas sem dúvida, ele sabia se divertir. E me divertir também.

CONTINUA